8.11.12

Do trabalho

Por razões que para o caso pouco interessam, em 1998, interrompi uma linha de investigação que, agora, retomo. Seguia à época um caminho de leitura centrado no continente africano e, sobretudo, nas imagens construídas pelos africanos e pelos europeus. Exercitava, então, um tipo de leitura que considerei imagológica.
Nos Cadernos Coloniais, editorial Cosmos, Lisboa, 1936, é possível identificar muitas dessas imagens que ajudaram a desenhar o imaginário do colonizador, mas também o daqueles que, desde cedo, combateram o colonialismo.
O Caderno nº 31 é constituído por um conjunto de artigos da responsabilidade do Padre Alves Correia (1886-1951). Vale a pena, creio, indicar aqui os títulos: a) Processos educativos, antigos e modernos, nas Missões religiosas portuguesas; b) Na evangelização da África; c) Na Índia  Japão e China; d) Processos peculiares em Solor e Timor; e) Brasil coroa do nosso apostolado; f) Nas missões ressuscitadas / Processos Novos.
Fácil é perceber que os agentes da missionação não aplicaram o mesmo modelo de educação /evangelização no terreno e que a doutrina era condicionado pela imagem que as ordens religiosas tinham do outro e, consequentemente, do lugar que poderiam ocupar no futuro dos territórios.
E quanto à visão do outro (do mundo) do Padre Alves Correia basta ler o seguinte excerto:

«Hoje está assente, entre todos os missionários do mundo, que a civilização cristã deve basear-se na organização do trabalho total do homem evangelizado; que a catequese doutrinal é pouco menos que inútil, se não se tiverem formado hábitos de trabalho nos catequizados; elevação do nível da vida, necessidades morais provenientes desta elevação, meios de satisfazer tais necessidades promovidos pelo exercício da actividade física e desejo crescente de instrução, que leva o homem à educação da inteligência, do coração, como do próprio corpo.»

Ora, parece que, atualmente, os nossos governantes têm fraca imagem do trabalho! E insistem em destruí-lo, sem perceber que é muito mais fácil destruir do que construir.


XXXI

I
a) Nós, hoje, estamos desconfiados dos deíticos!
b) Eles desconfiam dos deíticos.

Em a) considerando que a ação verbal decorre na sala de aula, o locutor envolve o interlocutor numa atitude de desconfiança em relação ao objeto. A situação de comunicação é partilhada devido à novidade e à utilidade do conceito.
Uma observação atenta do enunciado a) cria nos interlocutores uma relação de cumplicidade muito diferente     da que é exposta em b) O facto só nos interessa em termos de informação, não nos envolve.

Em termos esquemáticos, o enunciado a) é constituído por dois deíticos temporais: "hoje" /"estamos" advérbio - presente do indicativo, e por dois deíticos pessoais "nós" e -mos" - pronome pessoal e morfema verbal.

II - Na aula de Literatura (apoio), não houve qualquer cumplicidade: sem interlocutor.

III - A análise do discurso da sala aula, se rigorosa, acaba por mostrar que em simultâneo com o discurso institucional se desenvolvem discursos privados, sujeitos às mesmas regras que, no entanto, mais não são que formas de "ruído".

7.11.12

Dia XXX

I - No teste de Literatura, para além da pouca leitura, surge o problema do incumprimento das instruções. Não se trata de incompreensão, mas de desleixe.
 
II - Com metade da turma em visita de estudo, os restantes foram confrontados com a biografia do autor, de modo a procurar a presença da vida na obra. No caso, a presença da mulher no poema " A Minha Rosa".
Na nota biográfica do autor, é dito que, em 1846, Garrett conhece Rosa Montufar, Viscondessa da Luz... (Será o poema A Minha Rosa anterior ao conhecimento de Rosa Montufar?)
Por outro lado, a nota biográfica regista a vida, a obra e faz alguma referência ao romantismo (introdução)... o que permitiu atentar nos títulos, como, por exemplo, Dona Branca (1826) e Romanceiro (1843/1851)... 
E ao fazê-lo, abriu-se a porta à particularidade do Romanceiro corresponder a um projeto ideológico de fixação da oratura e da traditio, mas que teve forte influência na técnica compositiva do autor. ( Não sei por que motivo se insiste em literatura oral ou tradicional em vez de oratura!)  
O século XIX, romântico, acaba por simultaneamente valorizar os romanceiros e redescobrir os cancioneiros, tudo em nome do génio popular!
A leitura, fragmentada, da nota biográfica levou a que, sumariamente, fosse chamada a atenção para outra mulher na vida do autor - Adelaide Pastor (1837 - 1841). Dessa relação nasceu Maria Adelaide, que acabará por assombrar, por exemplo, Frei Luís de Sousa (1843) - a infeliz Maria... Tudo porque, afinal, Garrett, embora separado, ainda estaria casado com Luísa Midosi (1822)... 

6.11.12

Dia XXIX

I - Perceber que através do discurso também se sai do pátio para a sala de aula - do registo informal ao registo formal. Identificar "os ruídos" verbais (e não só) que perturbam a eficácia comunicativa. A sala de aula exige formalidade no tratamento e na interação comunictiva, tal como acontece num tribunal, no parlamento ou numa igreja... E por isso os deíticos pessoais, temporais ou espaciais devem ser utilizados com moderação, pois eles espelham o lugar em que os interlocutores se situam na comunicação ( no Manual, viajámos da página 29 à página à página 242).
 
II - Entretanto, na Literatura, confirmada a pouca leitura e a desmazelada escrita, passámos à poesia de Almeida Garrett ( A Minha Rosa, Não te Amo, Este Inferno de Amar, Barca Bela).
A musicalidade dos poemas. A tradição poética (Romanceiro). E a novíssima abordagem do amor.
Basta atentar nos três círculos de A Minha Rosa que se combinam e se sobrepõem não platonicamente, como a convenção impunha:
 
- A Rosa ( a flor;  hástia mimosa; folha; cor; coroar; desabrochar)
- A Mulher (face tão bela / face linda; lábios; sorriso)
- O Paraíso / Céu ( estrela; rainha; luz; singeleza; beleza)
 
O Poeta, embora consiga ascender ao céu, não deixa de ter uma ponta de ciúme, pois a sua rosa não é muito diferente das outras flores...
 

5.11.12

O fascínio do abismo

(Não me apetece contribuir para a queda no abismo.)
 
Forças sindicais, políticos do centro esquerda e da esquerda ortodoxa e heterodoxa desfilam palavras de ordem contra o memorando, mas não se sentam em torno de uma mesa e redigem um programa alternativo que permita ao Presidente destituir o governo e convocar novas eleições legislativas...
 
Sem eleições devidamente preparadas, resta a ditadura ou, simplesmente, a diluição da nação.

Dia XXVIII

I - Formas de tratamento. Cortesia. Registo formal e informal. Deíticos. Um percurso que, em comum, tem a situação de enunciação e respetivos atores (locutor, interlocutor, espaço e tempo).
Nada de extraordinário, a não ser essa dificuldade em perceber que só podemos viver no presente e que o discurso é uma forma de o capturar, de construir narrativas de maior ou menor saudade ou de sonho. Ficamos, assim, entre o passado e o futuro, categorias do discurso... Quanto ao presente..., esse lugar onde registamos a proximidade e a distância, quer em termos espaciais quer hierárquicos ou, simplesmente, nada..., sem âncoras, ficamos à deriva... O que acabou por conduzir à necessidade de explicar as perífrases e as metáforas que se vão instalando num discurso, ora feito de adiamentos ora de intuições fulgurantes, as últimas porque o raciocínio se torna intuitivo sempre que o que há a dizer é novidade... Mas esta imaginação verbal só singra se ancorada na experiência...
 
II - Teste de Literatura ou de pouca leitura...    

3.11.12

O Gebo e a Sombra (filme)

Gostei da reconstituição em espaço fechado, gostei da representação, embora não entenda tanta fungação. Já bastava que Doroteia passasse o tempo a cismar e a chorar...
Não gostei nada da opção pelo francês, embora perceba que os protagonistas pudessem ter dificuldade em exprimir-se na língua de Raul Brandão.
E sobretudo não compreendo a razão da supressão do Quarto Ato!Vê-se que o desfecho não agradaria a Manuel de Oliveira. E porquê?
 
Talvez porque:
 
a) Sofia se tivesse visto obrigada a trabalhar / a ser explorada numa fábrica,
b) «Odeio todos esses ricos que me fazem bem e que me dão de comer. Eles dão-me de jantar mas é por vaidade» (Candidinha)
c) «Eu sacrificara-me, para que os outros se rissem de mim.» (Gebo)
d) «A gente só se não arrepende do mal que faz neste mundo.» (Gebo)
e) «Foi tudo inútil! Foi tudo inútil!» (Sofia)
 
A opção de Manuel de Oliveira não se abre ao exterior, encontra solução na moral católica do cumprimento do dever, da obediência à lei... Na verdade, trai a solução muito mais angustiada de Raul Brandão que, atento às leis da política, da finança e da economia, se revolta...
 
C'est dommage!