15.1.18

Uma relação mal resolvida ou mal traduzida...

Com tanto estrangeiro embasbacado a fotografar a fachada, não resisti... até porque, de livro na mão, enregelava, à espera diante do nº 104...
Acabara de entrar no ensaio "L'inquietante étrangeté", de Freud e, tal como este, procurava uma tradução adequada, mas nenhuma me agradava, apesar da estranheza inquietante (angustiante) me parecer uma hipótese razoável...
Por seu turno, Freud ia gastando páginas atrás de páginas com o resultado das suas pesquisas sobre o significante nas diversas línguas europeias  correspondente a unheimlich, e parece que não encontrou, dando corpo à ideia de que as línguas guardam em si identidades (e mistérios) intraduzíveis!!!
Esta viagem linguística, a certa altura, revela-se deliciosa, quanto à tradução de unheimlich: « o italiano e o português parecem contentar-se  com palavras classificáveis como perífrases. No árabe e no hebreuunheimlich coincide com o demoníaco, o que provoca arrepios...» A tradução é minha e não é muito fiável, pois ainda faço fé no Luandino Vieira que não me contratou em 73/74 para as Edições 70, embora nunca me tenha explicado porquê...  
Daqui, talvez, se possa extrair que, para os portugueses, não há nada de verdadeiramente assustador e, muito menos, demoníaco... nem sequer a degradação das fachadas...
Em termos freudianos, resta saber quando é que esta familiaridade com a degradação terá tido início. Espero que não tenha sido uma relação mal resolvida entre D. Afonso Henriques e Dona Tareja, sua mãe, cujos vítimas terão sido os mouros despejados das amuradas...

14.1.18

Aliviado

Frequentemente, opto pelo silêncio. 
Hoje, no entanto, quero expressar o alívio que senti ao ouvir a confirmação de que Santana Lopes perdera as eleições...
O vedetismo do personagem não prometia nada de bom para o País.
De Rui Rio, espero que seja honesto e responsável - o que, afinal, espero de todos aqueles que abraçam a ação política... mas que não abusem dos abraços e da lamechice. 

12.1.18

Lembro-me de quase nada

A esta hora, ainda não saí da escola. Ocupo o tempo a eliminar ficheiros, designadamente de fotos sem valor... até que me surge a foto do lugar onde comecei a ler, a escrever e a contar... Observo-a mais uma vez e verifico que não me lembro do poço (da cisterna). Será que já lá se encontraria?
Lembro-me de quase nada ou, melhor, recrio o jogo do pião e a vontade de ter um pião que me custou uns tabefes valentes e a consequente devolução... a humilhação fatal que bem poderia antecipar o oráculo que me terá condenado definitivamente a este magistério. 
Lembro o austero professor, sem qualquer memória do perfil, apenas o gesto de chamar o aluno e de o castigar sem apelo nem agravo... e depois o regente porqueiro... e a jovem Mécia, urbana, em terra labrega que, pacientemente, me soube encaminhar para esta sala vazia, cercado de computadores   passivos e inúteis...
E claro, por perto, as azinheiras e as oliveiras de sempre...

10.1.18

Por uma questão de comodismo

Na opinião de John D. Sutter, especialista em aquecimento global,  estamos a menos de duas décadas de distância da próxima extinção em massa no planeta Terra e a primeira causada pelos seres humanos. Sem futuro

Faltam 20 anos para o fim da Terra! E eu que pensava morrer sozinho, vejo-me obrigado a morrer em companhia...
Por este andar, nada do que fazemos tem qualquer sentido. 
Por uma questão de comodismo, vou esperar que o senhor Sutter não passe de um novo Nostradamus, porque se estivesse à espera de uma alteração do comportamento humano mais valia antecipar a viagem...

9.1.18

Não gosto

"Ele, o homem. Ele, o testemunho, continuam vivos." Marcelo Rebelo de Sousa, RTP Notícias
               (Mário Soares)

Compreendo a intenção, mas não gosto da afirmação. 

Em primeiro lugar, porque devemos respeitar os mortos.
Em segundo lugar, porque a missão dos políticos é ocuparem-se dos vivos.
Finalmente, porque a valorização do passado só serve para diminuir o presente.  Até porque o argumento do exemplo nem sempre é conveniente...

8.1.18

O mundo interior

Hoje, a escrever, só se fosse sobre o mundo interior. O exterior de tão aborrecido enjoa-me, deixa-me incapaz de me aproximar da janela que permite avaliar se a ilha se vai extinguindo ou não...
Não é que a ilha me interesse excessivamente, porém sei que ela se projeta no meu horizonte, tal como imagino que, sem mundo interior, não sou senão um boneco ao lado de uma infinitude de outros bonecos, todos iguais...
Se imagino que tenho mundo interior é porque ainda sou do tempo do exame de consciência, posteriormente substituído pela autoanálise e ... pela autocrítica, embora esta já exigisse um palco em que os bonecos eram manipulados pelo bonecreiro...
Como se vê, do mundo interior nada digo, pois a esta hora, a paisagem escureceu, deixando-me a alma virada do avesso...
Desconfio até que o meu mundo interior nunca existiu ou, então, é indizível... E quanto à alma, o melhor é começar a arrepiar caminho...