15.11.18

A receita do momento

Há que dar a palavra aos jovens sábios! Especialistas em metodologia, defendem os enlatados sem lhes discutir a origem e o conteúdo… e se alguém o fizer, acusam-no de dispersão e de anacronia, não nestes termos porque, orgulhosamente, os ignoram…
O que importa é a receita do momento, não é que a queiram memorizar e experimentar, pois só lhes interessa estar, nem sequer lutar...
É preciso grande resistência para lidar com tal sabedoria, de qualquer modo finjamos que a montante nada aconteceu e que a liberdade herdada é perene…
A jusante, logo se verá ou, talvez, não seja necessário…, mas essa é uma linha impossível de abordar - está toda no Manifesto de Marinetti, publicado a 9 de fevereiro de 1909... Ai o passado!


1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insónia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com o seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo… um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.
5. Nós queremos glorificar o homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, esforço e liberdade, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um carácter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para obrigá-las a prostrar-se diante do homem.
8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!… Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade omnipotente.
9. Queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo –, o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.
10. Queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de toda a natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda a vileza oportunista e utilitária.
11. Cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e polifónicas das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor nocturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas lutas eléctricas; as estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as fábricas penduradas nas nuvens pelos fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de facas; os piróscafos aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço enleados de carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma bandeira, e parece aplaudir como uma multidão entusiasta. 

14.11.18

Estou curioso

Se a Polícia Judiciária não consegue identificar os meliantes que roubaram as armas de Tancos, se o Governo nada sabe sobre a matéria, se o presidente da República confessa o seu desespero por nada saber sobre quem furtou, quem devolveu e quem foi conivente, se até há gente detida por excesso de zelo patriótico, não percebo para que é que foi criada um comissão parlamentar de inquérito…
Estou, no entanto, curioso sobre os resultados de tal inquérito… até porque das comissões de inquérito anteriores só saiu fumaça...
Há, todavia, um estudo que os cientistas políticos poderiam fazer: descobrir por onde é que circulam tão ilustres "comissionistas"... para além dos "passos perdidos"...

13.11.18

Por aqui, as velhas

Por aqui, as velhas saem à rua, enraposadas e gaiteiras. Mal se aguentam nas canelas, mas nada as impede de ir beber o chá e destratar o criado, sim, porque elas ainda nasceram no tempo da criadagem…
Estas velhas não se furtam a mostrar (o smartphone tornou-se-lhes imprescindível!) as crias, a enaltecer-lhes as virtudes e a prole, mesmo se desgarrada…
Por aqui, as velhas não necessitam de ser velhas para se comportarem como tal: - ai, ai, já estou a sentir uma dorzinha, ai! oh! amiga, não tem por aí um analgésico?
( Analgésico? Devo estar cair nalguma impropriedade linguística, lexical, em rigor, semântica…)

11.11.18

Vou ver se há castanha

Chove, há castanha, jeropiga, um casaco puído que podemos oferecer aos vencidos… Que mais queremos?
Chove, hoje não é dia de finados, mas é como se fosse, os governantes brindam aos vencidos e aos vencedores, e compreende-se: uns morreram mais cedo, outros mais tarde; todos morremos…
Enquanto não chega a hora, brindemos a São Martinho, senão houver água-pé, há certamente jeropiga ou um malvasia, e castanha rica que outrora era dos vencidos…
Chove, vou ver se há castanha...

10.11.18

Usabilidade

O desenvolvimento de produtos e serviços que sejam fáceis de usar, respondam às necessidades dos utilizadores e tornem mais simples o acesso à tecnologia são os objetivos principais de quem se dedica à usabilidade, mas também a inclusão de pessoas com limitações físicas e seniores... 8 de novembro - World Usibility Day + O dia da usabilidade no mundo

Usabilidade. Mais um termo arrevesado, mas a globalização impõe o neologismo... O problema é que a Escola não acompanha; apesar da doutrina da flexibilização e da inclusão, não é capaz de acompanhar a mudança... Talvez seja por isso que a boçalidade alastra, pois a descrença no passado não encontra no processo de aprendizagem as verdadeiras ferramentas que poderiam alterar os comportamentos... Porquê?
Por falta de planeamento, de investimento, de renovação e efetiva formação do quadro docente... 

9.11.18

Tarde, muito tarde...

Eles comentam sem ter lido. Em geral, com posicionamentos radicais. Também não se esforçam para interpretar textos. Sua leitura superficial não é somente de um escrito, mas do mundo. Apaixonados por uma causa, ideologia ou credo, dividem o mundo entre contras e favoráveis à sua posição. São maniqueístas. Mas quem são eles? Gilmar Pereira, O primor da boçalidade

Não ouvem, não leem ou leem literalmente, não têm passado nem memória, calcam os valores e só lhes interessa o poder, mesmo que não passem de súbditos que anunciam lugares-comuns como verdades…
Claro que o alastrar da boçalidade é da maior utilidade para quem manuseia estes novos bonifrates que, por enquanto, ainda perguntam "Isto é fado?"
Tempo virá, no entanto, em que nem perguntas nem comentários e o coro das lamentações crescerá. Tarde, muito tarde…
Como tive acesso à password de caruma, inadvertidamente acabo de me fazer passar por ela, mas tal não tem qualquer significado nem desrespeita qualquer valor, até porque muitos outros, antes de mim, se habituaram inadvertidamente fazer o mesmo…

7.11.18

Mesmo se em efígie, Manuel Alegre

De modo que é chegada a hora de enfrentar cultural e civicamente o fanatismo do politicamente correcto. É uma questão de liberdade. Liberdade para não gostar de touradas. Mas liberdade para gostar. Liberdade para não gostar da caça. Mas liberdade para gostar. Algo que não se pode decidir por decreto nem por decisões impostas por maiorias tácticas e conjunturais, Não é democrático. Para mim, que sou um velho resistente, cheira a totalitarismo. E não aceito. Manuel Alegre_ Carta Aberta

Embora ribatejano, nunca apreciei touradas, e quanto às artes da pesca e da caça sou uma nulidade. Li, no entanto, a maior parte da obra de Manuel Alegre, como li a de Miguel Torga e a de Aquilino Ribeiro... Nelas sempre encontrei a exaltação da caça, da pesca e o respeito pelos bichos, entre eles os touros... 
Compreendo a exaltação dos moralistas do momento - o politicamente correto é intemporal, apesar de oportunista. Por isso não vejo qualquer necessidade de queimar Manuel Alegre na praça pública, mesmo se em efígie...
Ninguém lhe pode pedir que abjure da obra realizada nem do combate travado contra o totalitarismo do momento...