Haverá uma arquitectura de gaveto? E porquê “ de gaveto” e não “ de canto” ou “ de esquina”? Ou simplesmente perante a necessidade de ocupar as esquinas, o arquitecto procura encontrar a solução que melhor se acomode a cada caso. Seja como for, a simples existência de uma esquina condiciona a solução, o que, no fundo, significa que devemos evitar que nos acantonem, a não ser que desejemos que o Arquitecto determine o nosso destino…
Entretanto, desconheço a origem etimológica de “gaveto”. Na sombra, há quem pense que este termo está relacionado com “gaveta”, que, de origem latina (gavata, gabata) terá chegado a este canto da Europa através dos cruzados provençais que, ao passarem, meteram os indígenas na gaveta e lhes ocuparam o lugar. O que me leva a pensar que quer se trate de arrumar na “gaveta” ou no “gaveto”, o gesto pressupõe sempre uma certa violência, uma certa dor ou, em alternativa, alguma dose de predação.
Em síntese, não sei se algum arquitecto de esquina já pensou nesta questão nem se vale a pena examiná-la. No que me diz respeito, os gavetos sempre me despertaram um complexo de inferioridade… e se continuo, ainda acabo por encontrar o trauma que me leva a pensar estas tolices…
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Um olhar despreconceituado… ou talvez não. A verdade é tudo o que nós ignoramos.
18.6.10
Gavetos e não só…
16.6.10
Artistas, quase, anónimos…
14.6.10
Sonha-me (Ramos Rosa)
no ouvido do espaço
mesmo se o que separa
me apaga
Se o deserto me queima as mãos
se estou caindo
se nunca fui real
se sou ainda o movimento da sede
talvez possas pesar
esta boca de sombra
Como se pode querer tanto
e como custa
não ter boca
para levantar a casa
Se fosse um ombro ou um aroma
a mão lisa da água
a dália de uma sombra
Ah se fosse um fruto de água
Boca será boca
Esta desamparada pétala?
António Ramos Rosa, JL 13.11.1990
Sempre que proponho a leitura de um poema, mesmo que liberta de instruções”, sinto uma rejeição tácita ou mesmo ostensiva.
12.6.10
Ponto de vista e opinião…
São os múltiplos pontos ópticos, isto é, os lugares de onde percepciono, que me configuram a consciência. Sem eles, o meu mundo seria todo igual… Todavia, quando me ponho em marcha, as rimas tornam-se inesperadas, obrigando-me a contrastar os focos.. E daí nasce a consciência ou a má-consciência.
Por exemplo, na GEBALIS, as caixas de correio encontram-se esventradas; no contíguo bairro de lata vemos, junto à via pública, uma caixa devidamente identificada e em bom estado. Na mesma localidade, a limpeza e o lixo medem forças…; as plantas ornamentais rivalizam com as hortas; a simetria contrasta com o desalinho…
Em consciência, estes diversos pontos ópticos dão-me que pensar, mas não chegam para formar uma opinião.
11.6.10
O Petrarquismo na lírica camoniana
O petrarquismo
10.6.10
A negro…
8.6.10
O mapa e a laranja…
No comboio descendente
Vinha tudo à gargalhada.
Uns por verem rir os outros
E outros sem ser por nada
No comboio descendente
De Queluz à Cruz Quebrada...
No comboio descendente
Vinham todos à janela
Uns calados para os outros
E outros a dar-lhes trela
No comboio descendente
De Cruz Quebrada a Palmela...
No comboio descendente
Mas que grande reinação!
Uns dormindo, outros com sono,
E outros nem sim nem não
No comboio descendente
De Palmela a Portimão. (Fernando Pessoa)Quem desde os bancos da escola primária se habituou a olhar para o mapa de Portugal não pôde deixar de imaginar um país sempre a descer ou, em casos excepcionais, sempre a subir. Os rios descem para o mar, o dia para a noite! Ainda no século XIV, a Europa descia para a Mauritânia e precipitava-se bruscamente para o abismo. O mundo não passava de meia-laranja! Foi preciso o Infante lançar-nos ao mar para percebermos que a Terra não tinha fim, que, afinal, a terra não passava de uma laranja. Por isso, o Gama foi escolhido para contemplar o Globo e trazê-lo simbolicamente ao seu Rei e, este, feito senhor desta nova laranja passou a ostentar a esfera armilar, como se ela o sagrasse não como o “infante” mas como o “senhor”. Foram essa confusão e esse orgulho soberano que desfizeram o Império!
Cansado do Brasão, do Mar Português e do Encoberto, por instantes (1918), revelado no Presidente Sidónio Pais, Fernando Pessoa dedica-se a criar ritmadas sextilhas capazes de nos fazer esquecer qualquer desígnio divino ou nacional. Morto o rei, sobra a reinação. E o poema pândego serpenteia, sempre a descer de regresso à meia-laranja!