17.12.13

A mediação

«Pas de messianisme, parce que pas de médiation entre l'homme et Dieu.» Olivier Carré, L'Islan Laïque ou le retour à La Grande Tradition, 1993, Armand Colin

Na cultura judaico-cristã, a ideia de mediação é essencial. Os judeus vivem na esperança da chegada do Messias. Os cristãos encontraram o mediador na figura de Jesus. 
Nas duas civilizações, o Messias liga o homem a Deus.
No Islão, a relação do homem com Deus é direta.
Agora que o Natal se aproxima seria bom que levássemos em conta que uma parte do mundo não vê qualquer razão para se associar ao consumo desenfreado que caracteriza a época natalícia.
E como bem sabemos, o consumo é também ele resultado de uma relação de mediação estabelecida pelo comerciante entre o produtor e o consumidor... sempre com vantagem para o mediador!

16.12.13

Ecos da Turquia

Em Gramática das Civilizações (1963/1987), Fernand Braudel escreveu: «Como todas as sociedades, a muçulmana tem os seus privilegiados, pouco numerosos, por isso mais poderosos.» Para, ao referir-se à sociedade turca, registar a ação de Mustafá Kemal, autor de um «teste brutal e genial que soube abrir brechas num bom número de pretensos tabus da civilização muçulmana».
Em poucas palavras, o que estava (e está) em causa é «a emancipação da mulher, o desaparecimento da poligamia, as limitações ao repúdio unilateral pelo marido, a supressão do véu, o acesso às universidades e à cultura, aos empregos, ao direito de voto...» (pág.108, ed. Teorema, 1989)
Em 2013, o que procuro conhecer é em que fase se encontra a Turquia, de modo a entender quais são os obstáculos (endógenos e exógenos) à sua integração nas «civilizações europeias» e, simultaneamente, na União europeia...

Num mundo em que as comunicações são cada vez mais fáceis, esta minha pergunta indireta resulta de ter recebido o seguinte esclarecimento, a propósito da utilização de um telemóvel levado de Portugal: «na Turquia és obrigado a comprar um telemóvel turco, por causa das redes e taxas, coisas estranhas...»



15.12.13

Educação: 36.801,87 €; Justiça: 87,1 milhões de euros



Não era preciso distribuir tão mal o dinheiro!…
No mesmo bairro, no mesmo enfiamento, no mesmo país, como diria Cesário Verde:
«E eu sonho o Cólera, imagino a Febre, / Nesta acumulação de corpos enfezados; / Sombrios e espectrais recolhem os soldados; Inflama-se um palácio em face de um casebre.», in Noite Fechada, O Sentimento dum Ocidental.

14.12.13

Nunca pensei

« - Se já sou civilizado, então o teatro só pode servir para me divertir.»
Leio e volto a ler e nem sei se hei de pegar pelo "civilizado", se pelo "teatro", se pelo "divertimento".

Vou começar pelo Orgulho que me esclarece que não necessito de educação. Já nasci sabedor e educado! Há uns tantos seres inferiores, que esses, sim, por mais educação que recebam, por mais formação que obtenham, jamais beneficiarão dos prazeres da civilização... 
Lá no fundo, repudio o Teatro porque, desde a origem, ele quis que os seres inferiores transpusessem o fosso que os separa dos civilizados. A teoria da catarse terá sido inventada por um rebelde que, ao contemplar a serenidade do seu Senhor, acreditou que havia uma porta - do terror e da compaixão - que levaria o escravo à superação da bestialidade, fazendo-o participar no banquete da luxúria e da soberba...
No meu Teatro não há dor nem trabalho, não há fado nem superação! Apenas divertimento, puro jogo, puro gozo, porque do meu Teatro eu contemplo o mundo inferior...

(Nunca pensei que tivesse nascido civilizado, nunca pensei que o Teatro fosse outra coisa que os olhos do mundo e, sobretudo, nunca pensei que ele se esgotasse no puro gozo do aviltamento do Outro..., mas há cada vez mais indícios do contrário!)  

13.12.13

As minhas freguesias


Nunca é tarde para enriquecer a identidade!
Com a bênção do menino Jesus, e por ação do sapientíssimo governo passei a viver na freguesia de Moscavide e Portela… Eu que nasci relutantemente na freguesia de S. Pedro, cresci na freguesia de Assentiz, me transferi por uns anos para a freguesia de S. Salvador, regressei à freguesia de Assentiz… para terminar a adolescência na freguesia de S. João Baptista. Um pouco antes da instauração do regime democrático, vivi transitoriamente na freguesia de Nossa Senhora de Fátima, saltitando com Abril, entre a freguesia da Reboleira  e a de S. João da Pedreira, para depois me instalar duradouramente na freguesia de Algueirão-Mem Martins… Só que o destino não quis que ficasse por lá e acabei por me mudar para a freguesia da Portela… agora, por decisão do sapientíssimo governo,  Moscavide e Portela…
No meio de tanta freguesia, há um dado curioso: tenho vivido mais tempo em freguesias profanas!
Boas Festas!

12.12.13

Distorção e extorsão

A ordem dos termos não será aleatória!
Confesso que me choca que a classe política não dê conta de como a realidade económica e social do país é permanentemente distorcida. Os governantes parecem viver numa redoma, imunes à permanente manipulação da verdadeira situação financeira. Multimilionários afirmam que o  «país está teso». Na verdade os cofres do Estado podem estar vazios, mas os bolsos deles estão cheios! 
A distorção, alimentada por fundações, grandes empregadores, órgãos de propaganda de interesses empresariais,  políticos internos e externos, lança diariamente o anátema sobre os funcionários do Estado e sobre os pensionistas e reformados, reduzindo-lhes a capacidade de cumprir os compromissos que, ao longo da vida, foram assumindo...
Ao lado, milhões continuam as suas vidinhas como se nada estivesse a acontecer - banqueiros, fidalgotes, clérigos, empreendedores dúbios, especuladores e apostadores, usurários, desempregados, herdeiros, proxenetas, euro-burocratas, mercenários de toda a espécie...
São milhares de milhões de euros que se escondem e se mostram sem que o Estado se preocupe com a sua origem e com o seu destino!
Perante o desleixo, a impostura e a interesseira distorção, o Governo, através do Orçamento, lança da mão da EXTORSÃO contra os do costume: funcionários públicos, pensionistas, reformados e mais carenciados...
Como se sabe, o argumento é pobre porque falta a coragem ( não faltam os cientistas políticos, os sociólogos, os economistas, os gestores, os comentadores e os comendadores!) de avaliar a distribuição da riqueza, começando por distinguir o necessário do desnecessário, o razoável do desmesurado, o produtivo do supérfluo...

11.12.13

Suspensos...

(Sigo os radares à espera que Ancara te deixe dormir duas ou três horas antes que o Sol caia sobre a cidade.)
Apesar de tanta tecnologia, as viagens continuam condicionadas pelas intempéries... ficamos suspensos... e o futuro deixa de ser perscrutado no voo das aves.
Em terra, a linearidade do dia esfuma-se e as horas correm ansiosas... Na espera, os minutos arrastam-se, prolongam-se deixando que a duração nos asfixie...