21.10.14

Tanto fastio já aborrece...


E ponde na cobiça um freio duro,
E na ambição também, que indignamente
Tomais mil vezes, e no torpe e escuro
Vício da tirania infame e urgente;
Porque essas honras vãs, esse ouro puro,
Verdadeiro valor não dão à gente.
Milhor é merecê-los sem os ter,
Que possuí-los sem os merecer.


Camões, OS LUSÍADAS, Canto IX, estância 93.

Sem querer ofender o desconchavo de alguns jovens nem rejeitar o argumento de que, para eles, não faz qualquer sentido ler Camões, autor do longínquo século XVI, até porque já no tempo do Poeta o argumento parecia válido para os invejosos, não posso deixar de me interrogar sobre a razão de tal fastio.
A pedagogia recomenda que o professor se desdobre em estratégias, e existem umas tantas que estão para a leitura como a margarina está para a manteiga, eu insisto que não há leitura sem perceção visual (ou tátil, no caso dos invisuais).
Não é possível ler, sem livro, de livro fechado, na página errada, a conversar ininterruptamente com o parceiro do lado...
Parece-me, assim, que o problema do fastio é de natureza cultural, como já acontecia no tempo de Camões. É um problema de valores: de falta de valores ou de falsos valores...
Afinal, se já desistimos de combater os Serracenos, continuamos a desprezá-los e, sobretudo, vivemos mergulhados na cobiça, na ambição, na tirania, na vaidade, ESSE OURO PURO que corrompe o ESPÍRITO...

20.10.14

Burocratas ignorantes e prepotentes

Estou farto de burocratas ignorantes e prepotentes! Vou esperar pelo próximo episódio e depois vou a jogo.

(O arquiteto andou bem ao enquadrar o edifício. Há, no entanto, uns tantos gestores e burocratas que continuam à solta...)

19.10.14

O caso de Dustin Barca


É admirável ver Dustin Barca, que conta com o apoio de grandes nomes do surf mundial, como, por exemplo, Kelly Slater, arregaçar as mangas da forma que tem feito e pensar como é que o puto arruaceiro, que não hesitava em esmurrar pessoas sempre que surgia a oportunidade, se transformou num cidadão empenhado. “Fartei-me de ir parar à esquadra da polícia em Hanalei quando ainda só andava na escola primária. Era um miúdo muito problemático. Nunca tive pai, por isso não tinha quem me orientasse”, recorda.  Dustin Barca, em Entrevista ao Jornal i.

Barca é, em 2014, candidato independente, defendendo quatro áreas-chave: recuperar a cultura do Kauai, fomentar a agricultura sustentável, restaurar as hidrovias e combater o uso de drogas.

Para mim, esta foi notícia a que dei mais atenção neste dia, porque me faz pensar que os jovens podem encontrar o seu caminho, longe de tutores iluminados que não descansam enquanto não colocam sob a sua asa os jovens mais «prometedores» e não escorraçam para longe os «arruaceiros»; longe de pedopsiquiatras que tudo resolvem, receitando drogas aos adolescentes mais agressivos...
A leitura da entrevista faz-me pensar naqueles jovens que, todos os dias, entram a dormir nas salas de aulas e, assim, se mantêm por longo tempo... Dustin Barca desistiu do liceu no 10º ano porque queriam que tomasse Ritalin, medicamento usado para tratar a hiperatividade...
A explicação quanto à diferença de comportamento, reside na vontade. Na vontade de não ser dependente, subserviente e alienado. É esta vontade que pode gerar a contra-cultura  necessária à saída do marasmo e da abulia ou, então, à fuga do paternalismo tão frequente na nossa sociedade e, em particular, nas nossas escolas.

18.10.14

Aquém da realidade

À força de me confrontar com coisas que não quero descrever, sinto-me aquém da realidade. A cada minuto, tomo decisões - umas sensatas, outras insensatas - sem expetativa de recompensa ou de castigo....
Procuro não incomodar para poder ser incomodado. Sei que o cão que agora ladra, daqui a pouco estará calado. 
Olho a Agenda, rasuro e acrescento, sem que isso signifique mais do que um gesto vazio diante da lâmpada de cristal de sal que me invade de penumbra...
Despeço-me, entretanto, porque, dentro de momentos, regresso ao labirinto onde me esperam fios de hiper-realidade.
Sinto-me aquém da realidade!
/MCG

17.10.14

Plagiadores de 2ª mão


«Isto apesar de a comunicação do secretário de Estado incluir uma bibliografia onde são citados cinco autores, sem que nenhum destes sejam Reis Monteiro ou João Pedro da Ponte.» Público, 17 out 2014.

Outrora plagiar exigia leitura e cópia manuscrita ou dactilografada. Exigia revisão para não defraudar o original. O Autor do plágio, querendo parecer original, era escrupuloso ao ponto de se esquecer das aspas... Houve até quem, à força de plagiar, aprendesse a imitar, embora sem «nunca igualar ou superar o original"... Neste momento, já devem ter reconhecido o intertexto! 

Hoje, o plagiador é mais um «ladrão que rouba a ladrão» sem se preocupar com o perdão. Falta-lhe a consciência religiosa: pouco lhe importa a salvação da alma!
Hoje, o plagiador "googla-se" e, num instante, descobre o que lhe convém. Em dois movimentos (copy and paste),transporta os excertos para o regaço da secretária que, de pronto, os alinha de modo a que sua Excelência possa brilhar em qualquer simpósio...

E eu conheço tantos plagiadores neste inefável país!


16.10.14

O oráculo

Não é possível!
O oráculo, certa tarde, inspirou fundo e proclamou: Dos 39 não passarás!
Este oráculo era médico... pelo menos, foi assim que mo apresentaram. Mandou-me despir, observou-me atentamente e exclamou: Dos 39 não passarás! Nunca soube o que viu em mim...
Desde aquele dia que me interrogo: Para quando o fim?
Já começo a ficar desencantado, pois a leitura dos clássicos ensinou-me que não é possível fugir ao vaticínio do oráculo. Édipo, por exemplo, por mais peregrino que se tivesse tornado, acabou cego às suas próprias mãos...
Ora eu não gostaria de acabar cego por minhas próprias mãos, até porque já me faltam pai e mãe. Reconheço que estou livre de nefandos crimes, mas não sei se suporto mais a desilusão da profecia por cumprir...
Quando volvo sobre mim, sinto que não tenho estado à altura daquilo que cada um sempre quis para mim... agora, vejo-me de regresso à sala de estudo e penso: - foi preciso chegar aos 60 para ali ficar acantonado. Até quando?

15.10.14

Uma virtuosa ministra, Maria Luís Albuquerque


A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, disse hoje que os impostos no Orçamento do Estado (OE) para 2015 referentes a tabaco e álcool visam desincentivar comportamentos negativos e apoiar campanhas contra esses mesmos comportamentos.
"Desincentivar comportamentos com consequências negativas para a saúde" é o objetivo maior dos referidos impostos, cuja receita financiará também, por via do ministério da Saúde, campanhas alertando para os perigos associados ao consumo de álcool e tabaco.

Eu não bebo, não fumo, circulo cada vez menos de carro, estou a substituir os sacos de plástico por cestos de vime, não pinto o cabelo nem vou à manicura, já não sei o que é um alfaiate nem um sapateiro, estou a pensar em abandonar os medicamentos, deixei de tomar café, não como coelho nem sushi nem linguado, muito menos caviar e frutos tropicais... Todos os dias me imponho a fuga a comportamentos com consequências negativas para a saúde e para as finanças. Por este andar, pouco falta para ocupar o lugar que mereço na Jerusalém celeste!

Temo, todavia, que S. Pedro me bata com a porta na cara, sob o pretexto de que não sou suficientemente solidário (e pecador!) com a minha virtuosa ministra das finanças. Afinal, para equilíbrio das contas públicas, para pagar os juros da dívida que não param de aumentar, ela necessita que eu peque...Peque!

Imagine-se o que aconteceria à Nação se todos os cidadãos seguissem o meu exemplo! Quero crer que a Senhora Ministra está a mentir... Mais uma vez! Só que desta vez, mentir não é pecado!