9.7.12

A mão cega dos classificadores



Hoje é o dia em que muitos jovens sentiram que uma mão pesada se abateu sobre eles, apesar de terem trabalhado arduamente ao longo de dois ou três anos.

E essa mão cega ceifou a torto e a direito na seara que lhe foi imposta. 

E é preciso não esquecer que avaliação destes jovens está a ser feita sem qualquer equidade. Classificadores há que recebem formação e classificadores há que são nomeados à pressa!

Quando olho para os resultados que me vão chegando, vou perdendo a fé na idoneidade profissional dos classificadores. Há resultados de sacos de provas que deveriam ter sido aferidos antes de serem publicados. Provavelmente, não o foram porque vivemos em tempo de austeridade, mas esta não destrói apenas o corpo… pode minar, sobretudo, os valores, tornando-nos má moeda.

7.7.12

ÁREA DE NÃO CAÇA



ÁREA DE NÃO CAÇA

Gosto da expressão nominal: é apelativa como se exige! Apesar da proibição, não vislumbrei mais do que duas ou três carochas… Frustrado, segui o caminho serpenteado e privado,  desembocando numas perigosas arribas.

Na verdade, o mar vem devorando a terra, e os pinhais parece que deixaram de combater a erosão.

Em tempo de crise, talvez pudéssemos instalar uns tantos hidrantes… dávamos emprego a certos autarcas, protegíamos a escassa floresta e, talvez, limitássemos a erosão.

Creio, entretanto, que estamos a necessitar de um termo alternativo para “floresta”… Bosque? 

6.7.12

A hidra

Boca-de-incêndio? Tomada de água? Marco de água? Não! Hidrante é que é! Tal e qual como no Brasil… ou será um anglicismo – hydrant? De qualquer modo, ao investigar acabo por entender que o hidrante é um hiperónimo, pois designa equipamento de segurança usado como fonte de água, caindo a boca-de-incêndio sob a sua alçada…
… a alçada da serpente que nos pode devorar ou, então, levar-nos de regresso ao Brasil. O fio de areia, perdida a cabeça, estende-se para Sul, tão azul que nos faz esquecer o ponto de partida.
No meu caso, faz me esquecer que existem instituições que dão cursos em bandeja de ouro ou explica-me por que motivo, tendo um dia sido designado para um júri de apreciação do currículo de uma venezuelana, nunca mais repeti.
Acontece que votei contra as equivalências solicitadas, porque não reconheci à candidata competência em várias matérias e, sobretudo, qualquer domínio da língua portuguesa.
Afinal, isso poderia ter sido ultrapassado com uma classificação de 10 em Língua Portuguesa I, II, III, IV. Será que já alguém solicitou o programa destas 4 cadeiras?  

5.7.12

Vingado

Apesar do aviso, a luminosidade deslumbra-me e obriga-me a pensar no engenho e arte da natureza e, ao mesmo tempo, sinto-me vingado de todas as luminárias laranjas,  verdes ou pardas que nos governam.
( Camping Praia da Galé, Melides)
PS: No dia em que percebi que bastam 4 exames e 32 equivalências para se sair licenciado! 


PS. Não sei se sou objeto de censura, mas com alguma frequência as fotos desaparecem e o autor deste blog é reduzido ao anonimato.
MCG

3.7.12

Alvoroço no 83

Duas malas de viagem (75X35 cm), um casal de franceses (75X65 anos), na zona reservada a idosos e a portadores de deficiência, incomodam apenas até que um robusto invisual entra, esbracejando, no autocarro.

O desbocado invisual arreda tudo quanto lhe aparece pela frente, procurando sentar-se no lugar ocupado pelo francês, e, quando advertido que o passageiro era estrangeiro, desfaz-se em impropérios contra os turistas pobretanas que vêm para cá espezinhar os portugueses…

Poder-se-ia pensar que se trataria de uma altercação de alguém zangado com a vida, quando, subitamente, o sobrelotado 83 entrou em convulsão. De um lado, um grupo minoritário que defendia  e compreendia os pobres turistas; do outro lado, um grupo maioritário que resolveu secundar o invisual, dando expressão, em bom vernáculo, ao impulso xenófobo…

Chegados ao aeroporto, os turistas lá foram apanhar o avião, sempre sorrindo… e o 83 pôde, finalmente, rolar em paz!

Quero crer que estes turistas jamais voltarão a Portugal! Oxalá me engane!

30.6.12

Cisterna escura

(José Rodrigues Miguéis, O Amanhecer da Incerteza, Diário Popular, 8/11/ 1979)

De regresso ao Alto de Santa Catarina, Baltasar sente vontade de fugir, pois «a vida era este cárcere estreito e circular, uma cisterna escura onde nos debatemos, correndo em volta a tactear as paredes da nossa pobre experiência, prisioneiros teimosos e repetidos…»,  e relembra os amigos d’A Sementeira: «que sabia deles? quem eram, que sentiam, que pensavam na realidade como indivíduos atrás dos pórticos das Ideias e das Boas Intenções?»

A leitura abre-se para o Real: o que é A Sementeira? Já conhecia a Seara Nova? Mas, até este momento, nunca pensara que não há seara sem sementeira! Talvez tivesse pensado… Sabia que o republicano José Rodrigues Miguéis fora acusado de ser muita coisa: bolchevista, anarquista, burguês, reacionário… ao sabor dos ventos que iam soprando… mas, de repente, a minha ideia de que a ficção de Miguéis se alicerça no conhecimento do real  solidifica.

Em 1979, Miguéis para melhor conhecer o rumo do 25 de Abril mergulha nas páginas da revista anarquista A Sementeira (Setembro 1908 a Agosto de 1919) – a obra-prima de Hilário Marques, nas palavras de João Freire, Análise Social, vol. XVII (67-68), 1981-3.°-4.º, 767-826.

Aqui chegado, também eu me debato nessa cisterna escura em que somos formatados, apesar de, perceber que, ainda, há alguns pontos de fuga possíveis.  

29.6.12

Da safadeza

Farto de circunlóquios, mergulho nas páginas amarelecidas do Diário Popular do dia 25 de Outubro de 1979 e encontro, entre bares e prostíbulos, as divagações de Milheiro e de Baltasar sobre o modo como os portugueses encaram a realidade. (José Rodrigues Miguéis, O Amanhecer da Incerteza / Do «Idealista no Mundo Real»)

Interessante é ver que, em 1979, as viciosas personagens de Miguéis refletem sobre a nossa tendência para transigir com a vida, a nossa inclinação para o «compromisso pulha», apesar de, repetidamente, prometermos expor tudo no Roteiro da Safadeza Nacional. E é Milheiro que, já suficientemente alcoolizado, aponta a causa da nossa renúncia: a ilusão, nascida com Viriato, de que somos portadores de um grandioso destino.

Através de Milheiro, Miguéis mostra que não basta ler Camilo, Eça ou Junqueiro, porque a verdadeira Bíblia da Pátria deve ser procurada no Soldado Prático e na Peregrinação e, sobretudo, n’ A História Trágico-Marítima.

Mas isso era o que Miguéis propunha em 1979! E hoje, o que é que propomos?