25.9.12

Dia VI

A - « A literatura dramática é, de todas, a mais ciosa da independência nacional.»
Esta literatura / género /  modo cresceu em torno do conflito / crise. Não há drama sem crise, sem conflito entre vontades. E vem, pelo menos, da Grécia fundadora da democracia provocada pele heresia das primeiras minorias.
Associar crise a «independência» só pode fazer sentido, pois esta é afirmação e, ao mesmo tempo, ruptura... em tempo de crise.
Se para Garrett, um teatro nacional era uma necessidade absoluta, hoje, por maioria de razões, existem as condições políticas, sociais e económicas para que os dramaturgos apostem em temas nacionais... Só que  ao Estado não interessa fomentar o género literário que melhor pode espelhar o modo como equacionamos e solucionamos os conflitos internos e externos. 

( Esta linha de pensamento parece não ter razão de ser. A crise não existe, a não ser na sala de aula, e a minoria é representada pelo professor.)

B - José Luís Peixoto e o «Princípio dos primeiros dias» A redundância aponta o encantamento pelo feminino no que ele tem de ligação à vida, de presença (i)material...A irmã não faz sombra à mãe, está é mais próxima...

na hora de pôr a mesa, éramos cinco:
o meu pai, a minha mãe, as minhas irmãs
e eu. depois, a minha irmã mais velha
casou-se. depois, a minha irmã mais nova
casou-se. depois, o meu pai morreu. hoje,
na hora de pôr a mesa, somos cinco,
menos a minha irmã mais velha que está
na casa dela, menos a minha irmã mais
nova que está na casa dela, menos o meu
pai, menos a minha mãe viúva. cada um
deles é um lugar vazio nesta mesa onde
como sozinho. mas irão estar sempre aqui.
na hora de pôr a mesa, seremos sempre cinco.
enquanto um de nós estiver vivo, seremos
sempre cinco.


24.9.12

Dia V

A - Ponto de partida: apontar o que há de comum entre as palavras "autobiografia" e "biografia". As respostas são de natureza especulativa. Ninguém repara em "biografia" ou "bio" +´"grafia". Isto é, a tendência é ignorar a "materialidade" das palavras, aquilo de que são feitas, as palavras, os termos, os vocábulos... Ficou, assim, aberto o caminho para a significância, parte quase invisível / inaudível do signo linguístico. Claro que a maioria, apesar de tudo, conhece o significado dos constituintes: auto+bio+grafia. 
Por arrasto, surgiram as noções de "significado", "referente", "imagem acústica", "funções da língua", em particular, a "função metalinguística"... (Surpresa: ninguém ouvira falar das referidas funções! Parece que o Roman Jakobsom  foi definitivamente enterrado...) O extraordinário é que acabámos por chegar ao "património material" e ao "património imaterial"! E na matéria foi possível revelar a madeira, sem esquecer, afinal, que também podemos preservar a alma.
B - Quanto ao José Luís Peixoto, o texto autobiográfico deixa-nos marcas de materialidade: o atraso sistemático e a forma de tratamento "minha senhora", ao referir-se à professora. Mas o que se evidência é saudade da irmã que o levava à escola, da irmã entre as mães que atentamente escutavam a professora...

C- Ponto de partida: o teatro pós-vicentino - o teatro estrangeirado (castelhano, italiano, francês) - até que Almeida Garrett decidiu educar a nova classe - a burguesia.  Educar = Civilizar. Despertar para valores nacionais. Nos séculos XVII e XVIII, na perspectiva de Garrett, só Correia Garção e António José da Silva tinham condições para salvar o teatro nacional, mas o despotismo do marquês e o povo ignaro liquidaram-nos.

(A vontade de aprender pode brotar de um desejo ou de uma necessidade, o pior é quando não há nem desejo nem necessidade.

23.9.12

Interlúdio II

No âmbito do PIL, a leitura de Cortes de Júpiter, de Gil Vicente, justifica-se como estratégia para compreender o que significa «teatro dentro do teatro» e também para observar o processo criativo de Almeida Garrett, o romântico que não prescinde das fontes literárias: Bernardim, Vicente ou Camões.
Além disso, aquela comédia «que Vicente faz representar em Agosto de 1521, pertence a uma série de objetos de modelo circunstancial e alegórico em que o teatro celebra, articula, (de)termina uma festa da corte. Desta vez, de despedidas que podem ser para nunca mais. O teatro não se faz a contar uma narrativa, mas a descrever uma sequência de homenagens.» Osório Mateus, Cortes 

Ministro fora de estação


O ministro da Administração Interna (MAI), Miguel Macedo, disse hoje em Campia, Vouzela, que Portugal "não pode continuar um país de muitas cigarras e poucas formigas", ao mesmo tempo que enaltecia o "esforço do povo" para ultrapassar a crise. (Sapo)
O senhor ministro parece ignorar que no outono as cigarras têm poucas hipóteses de vingar e que, por seu turno, o povo que ele quis elogiar é constituído pelas ditas «formigas». Mas se as formigas são tão escassas onde é que está esse povo a que ele se refere?
No que me diz respeito, em matéria de insetos, hoje não escutei nenhuma cigarra e mesmo, em termos figurados, as que vi eram estrangeiras - do norte da Europa. O que não deve ser negativo para o turismo! Quanto às formigas, já não posso queixar-me, pois vi literalmente centenas delas. Todas ocupadíssimas, no seu canto, ou melhor, na sua linha, cumprindo o desejo
do senhor  Luís Portela: “não sei porque é que as pessoas saem para a rua a fazer barulho. Acho que a solução que nós temos de procurar é uma solução construtiva, de cada um, no seu cantinho, dar o seu melhor e procurar soluções.

22.9.12

Mudança


Muda a estação. Há quem o celebre e faça disso tema só porque o outono acrescenta uma sílaba ao verão.
No meu caso, o outono não acrescenta nada e o primeiro sinal de perda é me dado pela ausência das rolas. Bem sei que elas (ou as juvenis) voltarão, mas isso não interrompe o fluir do (meu) tempo.Será egoísmo da minha parte? Certamente.
De qualquer modo, esta ideia de perda pouco tem a ver com a mudança da estação, porque neste inefável país, todos estamos colocados à beira do precipício... e pouco fazemos para estancar o desperdício quotidiano.  

21.9.12

Interlúdio I

Se a solidez da sociedade resulta da capacidade de criar relações, a afirmação do indivíduo revela-se se ele for capaz de criar cultura. A ideia é de Fernando Pessoa e acabo de a encontrar no capítulo "Os Inadaptados", redigido pelo Dr. Rui Ramos (História de Portugal, VI volume, direção de José Mattoso).
Criar cultura corresponde ao que eu sempre pensei que deveria ser a função da escola. Memorizar e replicar só poderão ser andaimes nesse processo... 
Criar cultura é acrescentar! Não é imitar!
(...) Quando uma aluna me perguntou há três dias se, no âmbito do projeto individual de leitura (PIL), podia seleccionar uma obra de Almada Negreiros, ela estava, sem o saber, a escolher, um autor para quem criar cultura ( experimentar tudo de todas as maneiras) era o que distinguia os criadores dos dantas do seu tempo.
E por isso aconselho a leitura de Almada Negreiros:
  •  Os saltimbancos. 
  • Nome de Guerra
  • K4 O Quadrado Azul
  • (...)

20.9.12

O caminho

O caminho situa-se entre dois pontos mais ou menos distantes. Por vezes, a linha que percorremos tem na mira o outro, e sobre ele proferimos facilmente juízos agridoces. Habituados à ideia de que a causa do insucesso é exterior ou até anterior nós, enveredamos por becos sem saída.
O outro é a nossa muleta, sem ele ficamos sem desculpa.
Talvez, em consequência, decidi iniciar um novo caminho... agora SEM REDE. Um caminho que vou percorrer de dentro para fora...