17.11.13

Bendita austeridade, benditos credores

Não sei o que se passa no país! Da última vez que liguei a televisão apercebi-me que a capital se mudara para Cantanhede (?)... O Passos dirigia-se a um auditório invisível que, creio, ser o povo de Cantanhede, ameaçando-o com mais austeridade. Lembrou-me o Seguro que passa o tempo na província, ao rabisco...  

Entretanto, enquanto me dirigia à Rua da Quintinha, mesmo ao lado de São Bento, acabei por ouvir, na rádio, o ministro Branco, inebriado com a receção que lhe estão a fazer nos Emirados Árabes. Parece que os anfitriões lhe abrem as portas, sem nada lhe perguntar sobre a crise... Apesar dos simpáticos emires estarem dispostos a comprar o CR 7, o pobre do ministro da defesa compreendeu tudo ao contrário. Pensa ele que vai fazer negócio com os credores! Ou será ao contrário?

Considerados os exemplos, só nos resta servir o capital ou sermos contratados pelo Durão, pelos serviços prestados. O Gaspar já deixou a quarentena no Banco de Portugal, indo a caminho de Bruxelas! Bendita austeridade!

Falta explicar o motivo desta minha desinformação. Há dois dias que ando a inventar um teste que avalie a capacidade argumentativa e interpretativa dos meus alunos, sabendo, de antemão, que eles preferem que lhes faça perguntas de gramática, que isto de argumentar e de interpretar nada tem a ver com o conhecimento da língua. Basta ter opinião!
Por exemplo, se lerem este texto e encontrarem o termo "anfitrião", passam à frente! Para quê saber o significado? Deve ser qualquer coisa como porteiro! Afinal, quem é que está encarregado de abrir as portas e de carregar as bagagens?
Como lhes vou fazer a vontade, lá terei de rogar que identifiquem e classifiquem o(s) sujeito(s) na frase: Parece que os anfitriões lhe abrem as portas...
Quem souber que responda!

16.11.13

O feiticeiro, o amigo e o carrasco

Por mais que eu explique que a frase e o enunciado são coisa distinta, que a primeira pode ser autopsiada, classificada, desmembrada, sem incomodar o locutor, e que este será fortemente afectado se submetido a tais tratos, há sempre quem faça orelha mouca...

Vem isto a propósito de uma noticiada e citada «frase enigmática» proferida, em 1998, no Congresso do CDS, por Maria José Nogueira Pinto tendo António Lobo Xavier  como interlocutor: «O senhor sabe que eu sei que o senhor sabe que eu sei» (...) As reticências escondem a forçada cumplicidade dos interlocutores que só um enunciado pode obrigar.

O referente desta nova cumplicidade era Paulo Portas ou a natureza da ação do amigo de António Lobo Xavier.
De lá para cá, o segredo ficou esquecido, mas a frase reaparece, sobretudo, no discurso político, com uma carga enunciativa de desafio, de ameaça.

- E afinal se não venho revelar o segredo de Paulo Portas, com que objetivo é que desenterro o enunciado?
- Simplesmente, porque ao ler OS ANÕES, de Harold Pinter, descobri a fonte onde, provavelmente, Maria José Nogueira Pinto bebera: 

- Quem é o Pete?
- Um amigo meu.
- Um membro do teu clã?
- Membro? Ele é o feiticeiro.
- E tu quem és?
- O carrasco. Mas vai haver nova eleição no Outono.
- A sério?
- E então - disse Mark - quem sabe? Podemos ficar todos à procura de novo emprego.
- Ouve lá - disse Sonia - queres dançar ou quê? Senão vou arranjar alguém que queira.

Eu sei que tu sabes que sabes que eu sei.
                             edição D. Quixote, pág.171-172.

15.11.13

Obnubilações

Não sei o que dizer... estou cansado. Ainda ouço o ministro, paladino do conhecimento... enquanto que o ex-ministro lastima a falta de ética daqueles que decidem sem qualquer pudor...

Lembro-me do Poeta que criou uma epopeia para celebrar o tempo da glória (1498), mas que se viu obrigado a escrevê-la em tempo de tristeza. Na verdade, a epopeia transforma-se em elegia e ninguém ousa proclamá-lo. 
Uma triste epopeia guerreira!

Nesta terra, a simples ideia que acabo de registar não vale um cêntimo, pois não se conforma com metas e programas. É uma ideia inaceitável em termos de educação literária e, sobretudo, antipatriótica.

Houve tempo em que do outro lado da voz havia um ouvido atento, pronto a procurar na epopeia o argumento de validação. Agora a voz, pela janela em frente, atravessa o coreto por entre a peçonha que obnubila a mente.

Entretanto, ligo a televisão e as vozes são de glória e sem qualquer pudor...

No rescaldo, via facebook:
Conceição Coelho: Mas a epopeia não serve para que, em tempo de descrédito, as almas se elevem? Contudo, nas entrelinhas interagem muitas ideias antagónicas... A educação literária tem de fazer ouvir a voz dessas entrelinhas e ser ela própria um olhar transformador e crítico. Se não o faz para que servirá?

Manuel C. Gomes: "Cantando, espalharei por toda a parte" a ALEGRIA e a GLÓRIA - pensava o Poeta no início do projeto (ou cumpridor do protótipo?), mas o seu (nosso) TEMPO TRAIU-O.

    

14.11.13

Não é fácil ouvir o ministro da educação

Não é fácil ouvir o ministro da educação! 
Para este sofista, tudo pode ser reajustado desde que seja ele a determinar a doutrina.

Eu até admito que o Estado necessite de reestruturar os equipamentos escolares e de ajustar o ensino às necessidades do tempo que atravessamos, defendendo que as estruturas pesadas e estáticas devem ser substituídas por unidades dinâmicas e flexíveis.

O problema é que o atual ministro da educação está a executar um modelo que visa desmantelar a escola republicana, entregando-a  a uma rede de "amigos" para quem a educação é uma negociata.

À medida que o ministro Crato vai clarificando o seu pensamento, torna-se clara a matriz doutrinária que formatou o Estado Novo: uma pátria miserabilista, uma família conservadora, um isolamento altivo. Na base, a língua dos tempos de glória e o cálculo dos onzeneiros!

E neste regresso ao passado, só falta restaurar a filosofia do espírito... Por enquanto, temos ideólogo!

13.11.13

Da referência ou falta dela

Ao assistir à Gala "Camões A Nossa Escola", ia-me dando conta da quantidade de vultos que frequentaram o Liceu / Escola Secundária durante mais de um século e, ao mesmo tempo, ia pensando no modo como se constrói / destrói uma instituição. Ou seja, dei comigo a pensar nas omissões e nas promoções que voluntária ou involuntariamente fazemos...
Em 100 anos, é fácil destacar e esquecer!
Em 100 anos, a opinião tende a ocupar o lugar dos factos e quando isso acontece a referência dilui-se. Isto é, quando privilegiamos uma época ou uma individualidade, estamos a criar as condições para a menorização da instituição.
Em 100 anos, os antagonismos tendem a ser duais, e mesmo que saibamos que uma oposição é constituída por múltiplas expressões, acabamos por colocar do lado da "liberdade" quem se digladiava, desde que fique clara a frente de combate e, pelo caminho, vão ficando todos aqueles que, por convicção, não colaboravam com qualquer das partes...
Em 100 anos, a "liberdade" e a "opressão" tendem a cavar vias sinuosas, em vez de deixar que as avenidas se encham de todos aqueles que cavaram a terra e seguraram as escoras.
Quanto maior é o combate, maior é a necessidade de reunir todas as referências, sem artificioso unanimismo.


Camões, a nossa escola

A Grande Gala no Coliseu correu bem!
Os convidados, os professores e os alunos que participaram nos vários números foram inexcedíveis, a começar pelo apresentador Júlio Isidro que deixou claro que o objetivo é angariar 13 milhões de euros para recuperar o edifício da Escola, símbolo da arquitetura escolar do início do século XX.
No geral, o espectáculo foi sóbrio, sobretudo na primeira parte. A segunda parte acabou por se alongar desnecessariamente, gerando alguma ambiguidade e alusões, na minha opinião, desnecessárias. 
O momento menos conseguido terá sido o da entrevista simulada por dois conhecidos apresentadores de televisão, em que, na verdade, terá faltado o entrevistador.
O diretor, os professores, os alunos e os funcionários que com ele colaboraram estão de parabéns.
Quanto a António Costa, gostaria de conhecer o motivo que o impediu de dirigir duas palavras ao público. Afinal, o arquiteto responsável pelo projeto de construção do Liceu Camões, Ventura Terra, foi vereador da Câmara Municipal de Lisboa... 

12.11.13

O Eleito

O eleito, mesmo que não acredite em si, tem sempre quem acredite nele, quem o empurre ou quem espere que ele seja capaz de resolver qualquer problema por muito grande que seja.
Em tempos, Camões, descoroçoado, ungiu o Príncipe, já Rei, e prometeu-lhe: 

«Só me falece ser a vós aceito, 
De quem virtude deve ser prezada.
Se me isto o Céu concede, e o vosso peito
Dina empresa tomar de ser cantada,
Como a pressaga mente vaticina
Olhando a vossa inclinação divina,
Ou fazendo que, mais que a de Medusa,
A vista vossa tema o monte Atlante,
Ou rompendo nos campos de Ampelusa
Os muros de Marrocos e Trudante,
A minha já estimada e leda Musa
Fico que em todo o mundo de vós cante,
De sorte que Alexandro em vós se veja,
Sem à dita de Aquiles ter enveja.» 

Assim termina a EPOPEIA, incentivando o Rei a partir para o norte de África, e contrariando todos aqueles velhos do Restelo que, mais do que a Fama, a Glória, a Vaidade, a Cobiça, estimavam a vida humana...
E o Poeta acabou desempregado, embora por pouco tempo...
Este desejado e ungido Rei era, ainda, o guerreiro que sonhava apagar o nome de todos os Alexandros e que esperava ser o herói de NOVA EPOPEIA. E foi esse sonho que o matou, apesar do Super Poeta, séculos mais tarde, lhe profetizar o regresso, depois do Nevoeiro, pois acreditava que o Mito era suficiente para despertar a Alma de um Povo, não percebendo que este Povo deixara de acreditar no Senhor e que, por mais que Ele quisesse, o sonho se desvanecera num fim de tarde...

PS. Dentro de momentos, também eu partirei para o COLISEU! Mas não levo armadura nem cavalgadura...