24.5.14

Contrastes e não só...

O dia é de reflexão e de futebol. Mas como? As atividades são incompatíveis. Ainda pensei entrar na igreja, mas o casebre ao lado lembrou-me o verso de Cesário Verde: «Inflama-se um palácio em face de um casebre.» Este é daqueles versos que nunca consigo esquecer...
Entrei na Segunda Circular - por volta das 14h45 - e não vi sombra de invasão castelhana!
A última, a sério, data do século XIV. Ainda pensei que os castelhanos da atualidade tivessem substituído a cavalaria pela aviação, mas não enxerguei sinal de qualquer anti-aérea no quartel. Deserto como as ruas, não vi qualquer explicação para a sua manutenção.
No entanto, lembrei-me, de imediato: «Partem patrulhas de cavalaria / Dos arcos dos quartéis que foram já conventos; / Idade Média! A pé, a passos lentos, / Derramam-se por toda a capital, que esfria.
Sempre Cesário Verde!
A reflexão não necessita de Igreja nem de Quartel. Está feita desde o golpe de estado de 2011...
Na verdade, o que me interessa é a clivagem (o contraste) entre países, entre profissões, entre ricos e pobres... 
O que me interessa é que o dia de reflexão e de futebol não se esgote na alienação...

Apelo ao voto…

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Na véspera da ida às urnas, a minha reflexão é simples: jamais compreenderei o ato de todos os que podendo votar o não fizerem.

23.5.14

Um instante!


Quando o ruído aumenta, procuro o silêncio discreto das alamedas desertas. Pura ilusão! A vida espreita sem alarme e dá-me mais um instante. Um instante!

22.5.14

A minha máscara original é vegetal

How many masks wear we,  and undermasks,
Upon our countenance of soul, and when,
If for self-sport the soul itself unmasks,
Knows it the last mask off and the face plain?
       Fernando Pessoa, Sonetos Ingleses

Ah quantas máscaras e submáscaras,
Usamos nós no rosto de alma, e quando,
Por jogo apenas, ela tira a máscara,
Sabe que a última tirou enfim?
        Trad. de Jorge de Sena

De tempos a tempos, vejo-me envolvido em jogos de máscaras. E sempre que tal acontece, surpreendo-me a observar a matéria de que elas são feitas. A materialidade da máscara! Severa, hilariante, trocista, cínica, austera, sedutora, imberbe, convencida, secreta, a máscara avança e arrasta-me numa dança abismal.
As máscaras avançam para mim, mas não se sobrepõem, podem disputar-me, mas não se atropelam. Se as observo uma segunda vez, elas põem-se em fuga... elas temem que as denuncie...
Ensinaram-me que a máscara é antiquíssima, que subiu ao palco para esconder a identidade, para fingir ser quem não é.... Ensinaram-me que a máscara é filha do subconsciente, do padrão de cultura, do superego, de Zeus...
No entanto, a minha máscara original é vegetal, uma parra esquecida no Éden à espera da nudez inicial...   

(No segundo dia de avaliação externa, a máscara continua azul...)

21.5.14

Notas de um individualista, trabalhador

O  meu problema, de momento, é perceber o que é um cluster e, sobretudo, que posição é que eu ocupo no seu interior. Já percebi entretanto que tenho andado desenfiado. Em rigor, eu pertenço ao "cluster " dos camponeses e deveria estar classificado como excelente, muito bom, bom, suficiente ou insuficiente  -"camponês".
Por ação de uma senhora professora, Mécia, de seu nome, fui desviado do "meu cluster" e posto a estudar para servir Deus e o Estado. E aí, perdi-me definitivamente. Entrei num outro "cluster", que não me estava destinado, e fui subindo, e já longe do Altar, vi-me certificado como mestre... E como estava muito longe do ponto de partida, comecei a cair. Hoje, já não sou mestre, nem professor, nem pai (só pago as contas!), nem aluno, nem trabalhador não docente. Sou, por enquanto, trabalhador, por decisão de um "cluster" secreto. Falho de humor e de inteligência, resigno-me, apesar de desconfiar das certezas que permitem premiar os esforçados e ignorar os menos prendados, porque consta que a clusterização está normalmente associada com a análise exploratória, pois envolve problemas em que há pouca informação a priori acerca dos dados (por exemplo, modelos estatísticos), e poucas hipóteses podem ser sustentadas. Análise de Dados em Bioinformática – Profs. Moscato & Von ZubenDCA/FEEC/Unicamp

Precisamente, por haver pouca informação e pouca verdade, aproveito para lembrar aqui que a focalização é omnisciente se ilimitada quanto ao âmbito e alcance que atinge e aos elementos informativos que faculta; a focalização é interna se condicionada pelo campo da consciência de uma personagem inserida na história. Carlos Reis, O conhecimento da Literatura,1995, pág. 366, Almedina.

Servem estas notas vários propósitos. Lembrar que: Quem rouba a ladrão tem cem anos de perdão e não de solidão; b) O segredo é a alma do negócio; c) a focalização interna corresponde a um avanço civilizacional, atingindo o grau de excelência quando a focalização se torna polifónica; d) o "cluster" é uma nova forma de simular a mobilidade social e cultural; e) o inquiridor só produz narrativas fechadas e seguramente omniscientes, tendo necessariamente um poder absoluto sobre o tempo que, todos sabemos, adora devorar os homens... 


Notas de um individualista

I - A análise dos resultados globais dos últimos três anos mostra que a taxa de sucesso nos Cursos Científico-Humanísticos, no ano letivo 2012/2013, é ligeiramente inferior à do ano anterior.

Porquê? a) degradação do estatuto social e profissional do professor; b) aumento das desigualdades sociais; c) aposentação abrupta e precoce do corpo docente; d) precariedade do exercício da atividade docente; e) clivagem cultural entre alunos. 

II - Quanto à cultura profissional dos professores, a maioria afirma a sua disponibilidade para trabalhar em grupo, partilhar materiais didáticos, refletir sobre práticas de ensino. Neste domínio, as manifestações esporádicas de individualismo tendem a ser ultrapassadas.

Mostrar disponibilidade não é o mesmo que fazê-lo. Há, no entanto, parcerias ativas. Quanto ao individualismo seria conveniente apurar se ele é efetivamente nocivo como parece decorrer do enunciado...

III - Os professores pensam que há uma cultura de organização centrada no valor da aprendizagem, que a oferta cultural é diversificada, que os pais são estimulados a participar na escola e que os atores educativos se envolvem ativamente nas tomadas de decisão.

Os professores pensam que há uma cultura de organização centrada no valor da aprendizagem! Neste caso, conviria especificar o tipo de aprendizagem e, também, se a prática está à altura da convição. 

IV - As lideranças das estruturas de coordenação educativa e supervisão pedagógica são valorizadas em termos de coordenação, supervisão, articulação, gestão, cooperação e acompanhamento das atividades.

Estas lideranças são valorizadas por quêm? E em que termos? 

V - A nível intradepartamental, o planeamento e a articulação concretizam-se na definição de objetivos de aprendizagem e de critérios de avaliação para a sua monitorização.

A monitorização nas condições atuais é inexequível, tal é quantidade de tarefas atribuídas aos coordenadores de departamento e de grupo disciplinar.

VI - A interdisciplinaridade, entendida como instrumento que permite a captação de uma mundividência particularmente enriquecedora para os jovens, é privilegiada no desenvolvimento de projetos que favoreçam a criação de sinergias duradoiras.

A interdisciplinaridade, strictu sensu, é impossível porque ao Conselho de Turma não são asseguradas condições (horas, ferramentas, espaços) para que possa desenhar qualquer projeto verdadeiramente interdisciplinar.

VII - O investimento feito nas novas tecnologias de informação e comunicação, apesar de certas dificuldades de acesso aos equipamentos que ainda ocorrem, mostra não só a justeza desses investimentos como a necessidade de continuar essa aposta.

O apetrechamento da maioria das salas é folclórico. Um espaço de aprendizagem moderno  exige que todos os alunos tenham acesso a computadores em rede. 


VIII - A cultura existente na aferição dos critérios e dos instrumentos de avaliação, bem como os critérios emanados das estruturas de coordenação e supervisão, aprovados em Conselho Pedagógico, são evidências do trabalho desenvolvido nesta área.

Nos últimos anos, o Conselho Pedagógico perdeu importância, estando reduzido a um órgão de consulta, totalmente subordinado ao Diretor e ao Conselho Geral.  A própria noção de "pedagogia" encontra-se desvirtuada, cedendo o lugar a modelos sociológicos assentes na análise estatística de expetativas e de resultados alcançados em exames nacionais elaborados de forma reducionista.


20.5.14

Uma escola amiga e consensual...

Uma escola consensual é aquela em que ouvidos os diversos corpos, há acordo explícito.
Sintomaticamente, há pleno acordo quanto à falta de conforto das salas, quanto à abertura da instituição ao exterior e quanto ao ensinar (97,2%), estudar (89,1%), trabalhar (100%) e ter filhos a frequentar a Escola Secundária de Camões (94,1%). 
A partir daqui, as diferenças de perspetiva tornam-se significativas... Os alunos revelam uma visão mais assertiva e crítica em relação ao conjunto dos itens em análise. 
No entanto, no que respeita à exigência do ensino, os alunos não divergem significativamente: 75,2% manifestam-se de acordo, acompanhando os trabalhadores não docentes - 81,8%, os pais - 89,6%, e os professores - 86,6%.
Um item cujos resultados dão que pensar: 79,1% dos professores declaram utilizar o computador na sala de aula, no que são confirmados por 75,8 % dos trabalhadores não docentes. Porém, só 27,2% dos alunos declaram utilizá-lo na sala de aula...

Este último dado é aquele que é mais preocupante, pois é um indicador do que distingue a escola portuguesa da escola, por exemplo, nórdica ou da escola alemã.