19.5.17

Às vinte em ponto

Às vinte em ponto, o telefone tocou, mas o destinatário mostrou-se indisponível, deixando-me o encargo de colher a mensagem, simples de registar: reduzir significativamente a dose de venlafaxina (de 225 para 75 mg) e inviabilizar a utilização do respetivo genérico...
A recusa mais não é do que a confirmação do estado de perturbação em que o destinatário se encontra, pois passou de profunda disforia  a uma situação de hiperatividade frenética desproporcionada e irrealista - transtorno bipolar...
Após a consulta telefónica, seguiu sms com a indicação de todos os medicamentos (e não só!) tomados diariamente, pois aquilo que mais me preocupa é a toma de betametasona, em gotas, pela facilidade da sua aplicação tópica...

(Pode viver-se em silêncio, o problema, contudo, agrava-se quando a memória se degrada.)

18.5.17

Quando o telefone toca

O telefone tocou, mas era apenas para assinalar a chegada à porta de casa, e para pagar o táxi. Melhor assim! À hora de ponta, é preferível não descer à plataforma repleta de gente apressada e mal-humorada.
Hoje, espero que o telefone volte a tocar e que, do outro lado, se faça ouvir uma voz autorizada, que dê instruções ajustadas.
Há, no entanto, um escolho: o destinatário, embora não saiba que o telefone vai tocar às 20 horas, já ameaçou desligá-lo.
Entretanto, informo o leitor eventual que doravante deixarei de encaminhar estas postagens para o Facebook.

17.5.17

Temo que o telefone toque

Não é só quando a noite cai que os impulsos se descontrolam. Ultimamente, saltam dos álbuns para as redes comunicacionais e de transporte. Dão infinitas voltas, até que, no regresso a casa, crescem no silêncio e impõem-se muito para além da razoabilidade humana... Há quem lhe chame violência doméstica, eu prefiro ficar-me pelo descontrolo emocional, embora desconheça o alcance das emoções...
Na hora de ponta, temo que o telefone toque. Afinal, em cada esquina vive uma infinitude de emoções capaz de provocar, a qualquer momento, uma convulsão...

16.5.17

O açafrão e a canábis num tribunal de Aveiro


"É verdade que fizemos a plantação, mas não foi nada planeado", disse a mulher, adiantando ainda que na primeira vez foram enganados por um cunhado, que lhes terá pedido um terreno para plantar açafrão. Perante o julgamento, a arguida adiantou que tudo se descobriu após um ‘vendaval’, a estufa terá caído para o terreno de um vizinho e o cunhado ficou muito 'aflito'.Um casal empreendor, mas ingénuo

Gosto do história do casal condenado a prisão efetiva, vítima de um vendaval e sobretudo, no dizer da senhora, de um cunhado. E também aprecio que o vizinho agricultor de 71 anos, já experimentado, também tenha sido condenado. Só não percebi o que é que aconteceu ao cunhado... 
O advogado de defesa só podia encontrar atenuantes, argumentando que "eles não são nenhuns profissionais do crime". Concordo. Só que me parece que eles revelaram pouco profissionalismo ao não distinguirem os cormos do açafrão da semente de canábis.

Por outro lado, o acórdão parece-me bastante rigoroso e em conformidade. A juíza-presidente, durante a leitura do acórdão, disse que ficou provada “a generalidade” da matéria de facto que constatava a acusação.
A generalidade? Então não foi por causa da generalidade que o casal confundiu a canábis com o açafrão?

15.5.17

Marcelo, o pedagogo, disserta sobre Álvaro Cunhal e a Democracia

O Senhor Presidente da República deslocou-se esta manhã à Escola Secundária de Camões, onde deu uma aula sobre Álvaro Cunhal e a Democracia
Perante uma repleta e atenta plateia de alunos e professores, o professor Marcelo Rebelo de Sousa traçou o retrato político do antigo aluno do Liceu Camões, à semelhança do que já fizera com outros "pais da democracia" - Francisco Sá Carneiro e Mário Soares. (Até ao final de Maio, completará a iniciativa com Diogo Freitas do Amaral.)
Porque entende, à semelhança do que praticara Álvaro Cunhal, que a função do homem político é, entre outras, pedagógica, o  Presidente decidiu fazer este périplo pelas escolas secundárias (antigos liceus), pois considera que elas dão um importante contributo para a formação de todos aqueles que se entregam à causa política, independentemente da opção de cada um.
Da ação de Álvaro Cunhal, o Presidente destacou duas fases: antes e depois do 25 de Abril de 1974. Na primeira, referiu a frequência do ensino doméstico em Seia e posterior entrada no Liceu Camões em 1924, onde terá evidenciado profundo apreço pela nova política russa, revelando cedo a sua oposição à ditadura militar de 1926... Entrou em Direito com 17 anos... Em 1934, foi eleito representante dos estudantes no Senado da Faculdade. Em 1935, já era o líder da Juventude comunista, na clandestinidade (...). Entretanto foi preso, tendo concluído, com distinção, a licenciatura, em 1940, com a defesa de uma Tese sobre "O Aborto: Causas e Soluções"... Entre 1949 e 1960, esteve ininterruptamente preso, passando 8 anos em regime de isolamento, acabando por se evadir, refugiando-se em diversos países europeus, só regressando em 1974. Em 1961, foi eleito secretário-geral do PCP, cargo que ocupou até 1992...
Depois do 25 de Abril, o resistente antifascista manteve os ideais da juventude, sabendo gerir os percalços da democracia, mesmo que esta se viesse a afirmar como um retrocesso revolucionário e, sobretudo, viu-se forçado a assistir ao desmoronamento da União Soviética...
De Álvaro Cunhal, Marcelo traçou o retrato de um homem culto, disciplinado, duro, com quem apenas dialogou duas vezes, de forma breve, resistindo a pronunciar-se sobre a pessoa na intimidade porque, na verdade, nunca com ele privou.
Claro que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa abordou muitos outros aspetos da vida portuguesa pós-25 de abril, fazendo-o com a discrição e a elegância próprias de um príncipe florentino..., se excetuarmos as selfies.

14.5.17

Em suspensão...

"Cada pessoa tem o seu problema." Salvador Sobral
Gosto da forma assertiva do Salvador Sobral, pois ele parece lidar com um problema tão nuclear que todos os outros se tornam insignificantes ... Há algures uma sereia que o arrasta, perigosamente.
Essa sereia também nos encanta, só que, no meio da diversidade dos nossos problemas, torna-se de tal modo inaudível que nos arriscamos a soçobrar sem apelo...
Salvador, um pouco como Ulisses, concentra toda a sua energia em captar e incorporar a melodia, sem deixar de estar acorrentado ao mastro primordial.

Nós, pretensamente, libertos das correntes, continuamos no reino da crença e da magia, à beira do precipício, como se o dia seguinte pudesse ser igual ao anterior, suspensos... 

13.5.17

Estado de alma

A festa saiu à rua!
Veio o Papa, o povo cristão desenfadou-se da tristeza: cantou, acenou, chorou e voltou a casa, convencido de que a aurora de amanhã lhe sorrirá...
O Benfica ganhou o tetra e já sonha com o penta para melhor humilhar os rivais...
E ainda não conhecemos o resultado do Salvador, mas dele só podemos esperar a vingança das derrotas acumuladas desde que existe eurovisão...
Por mim, todo este frenesim me cheira a alienação, pois esta massificação das vontades traz-me à memória outro tempo, o das catedrais, mas pode ser que o bulício me tenha provocado tal confusão mental, que eu esteja totalmente errado, ou como Sartre (La Mort dans l'âme) escreveu certo dia:

                             Quand on ne fout rien, on a des états d'âme, c'est forcé.