5.10.11

Feriados e mais feriados

A República não só não soube tirar-nos da decadência como nos atirou para os braços de um ditador autista que, por seu turno, gerou um regime, pretensamente libertador, mas que nos ostraciza definitivamente.
Na situação atual, um feriado a meio da semana só pode significar que continuamos a não perceber que necessitamos de mudar de vida. E vêm aí mais feriados e dias santos – 1 de Novembro; 1 de Dezembro; 8 de Dezembro; 25 de Dezembro… E não sei quantos feriados municipais!
O Senhor Presidente da República, se não quer ser lembrado como coveiro da Pátria, bem poderia começar por exigir ao Parlamento que elimine a maioria dos feriados e dias santos.

4.10.11

A prova dos nove…

A escola é tanto mais pujante quanto maior é a participação da comunidade educativa na construção e no incremento do respectivo projecto educativo.

Face à decisão da tutela de proibir a entrega do prémio de mérito ao melhor aluno de cada escola, é chegada a hora de cada comunidade educativa assumir a responsabilidade de não defraudar todos aqueles alunos que se aplicaram ao longo do ano lectivo, sabendo, de antemão, que só um ou dois seriam premiados.

30.9.11

Inutilia truncat…



Se os discursos são tão planos que de nada serve tentar podá-los, pelo contrário, no tecido (in) produtivo português há um ilimitado campo de ação.

Em Portugal, há milhões de portugueses que beneficiam de regalias escondidas, e que se avolumaram nos últimos 30 anos na sequência de  desastrosas cumplicidades entre partidos, gestores e sindicatos. Empresas com dívidas insuportáveis continuam a alimentar as suas clientelas como se nada estivesse a acontecer e, despudoradamente, os seus representantes falam diariamente da necessidade de todos partilharmos esse despesismo.

Esta ideia de partilha mais não é que uma forma de punir quem trabalha honestamente e quem cumpre todas as obrigações que o Estado lhe impõe.

O direito à indignação precisa de ser revisto. Os indignados deveriam iniciar uma luta sem quartel contra prémios, horas extraordinárias, cartões de crédito pagos pelas entidades patronais, veículos oficiais ou de empresa, viagens gratuitas na tap, cp, carris, metro, cantinas corporativas, casões, sacos azuis, amarelos ou vermelhos, orçamentos privativos em escolas, universidades, hospitais, fundações sem capitais próprios, privilégios das múltiplas igrejas, misericórdias, sem esquecer os corvos que nos deixam as tripas ao sol.

28.9.11

As flores do Poeta…

Um poeta tradutor, se por um lado corre o risco de matar a criação, por outro arrisca tudo ao ocupar o lugar do feiticeiro que antecipa as chuvas que fazem a glória do rei.

Este tradutor é modesto, pois não se pensa singular, e, ao mesmo tempo, não abdica de dar voz (asas) a uma realidade de pés descalços, seca, sem hino e sem bandeira, mas que, no antigamente, transformava cada semente em flor. Tudo como se o presente tivesse perdido o rumo ao deixar-se formatar por estranhos lugares-comuns.

E quem poderá traduzir essa vontade de regresso ao tempo solidário?

Na verdade, só a semente / oferece flores, mas, para que isso aconteça, o chão (o poeta) terá de ser permeável às chuvas.

Ser ponte, voltar atrás, parece ser o caminho escolhido pelo “palavrador” Mia Couto, em Tradutor de Chuvas,  pois a verdade reside num tempo definitivamente perdido, a não ser que as chuvas façam germinar as sementes…

O papel / antes do poema, / é um chão depois da chuva. // O idioma do grão / lavra a caligrafia do pão.//

Em conclusão, apesar de nem todos os poemas serem flores, fica-nos a lição da semente…, embora haja quem nela tenha visto uma prova de machismo, que, creio, precipitado!  

25.9.11

À sombra…

Barro, plástico, cobre, latão, vime, flores, farturas, bifanas…tudo a pataco (euro) e à sombra da Ordem franciscana! (As gentes chegam mais tarde para o encerramento espiritual da Feira da Luz.) Por mim, faltam as peras cozidas. A dizer a verdade, já devo estar a pensar na Feira das Mercês…

E ainda há quem pense que Portugal não tem futuro!

24.9.11

Tempo malbaratado…

I - Para quem estuda na Escola Secundária de Camões, a leitura de Domingo de Lázaro deveria ser obrigatória. Aquilino Ribeiro retrata, de forma sarcástica, a vacuidade das opções ideológicas dos docentes do Liceu  durante o 1º conflito mundial. Por outro lado, mostra com crueza o comportamento indisciplinado de alunos que desprezam o trabalho…Finalmente, descreve o irrealismo e a fatuidade docentes, para além de deixar um olhar impiedoso  sobre a família portuguesa, sobretudo, rural.

II – Acabo de reler, em Estrada de Santiago, a novela A Grande Dona que introduz uma reflexão sobre a incapacidade do homem aceitar a sua condição, seja ela de pobreza ou de efemeridade. O filho do moleiro do Gorgulhão, afilhado da Morte, vai ao ponto de litigar com Ela para adiar o seu destino… À terceira refrega, o afilhado afunda-se irremediavelmente no pélago sem fundo… ( o outro lado do céu).

A demanda do padrinho rico é uma narrativa cheia de surpresas no que revela da capacidade argumentativa e indagadora de Aquilino. Nem Deus nem o Diabo servem como padrinhos! Os argumentos seriam mais tarde (?) partilhados por Miguel Torga. Só a Grande Dona!: «Alta, delgada como círio, de órbitas cavas e dentes alvíssimos, a cabeça toda uma mancha de calcário, a intrusa vestia um capindó da corte triste do luar.»

Os textos de Aquilino são verdadeiras lições de história, geografia, política, antropologia, religião, mitologia e costumes… mas o que me seduz é o vastíssimo conhecimento da língua, testemunho de um tempo que se perde a cada dia que passa.

Com a morte da língua portuguesa, morremos todos!

23.9.11

No lugar do céu…

O que eu vi,/ à nascença, foi o céu.” Mia Couto, Tradutor de chuvas, 2011

Só um poeta poderia afirmar tal coisa. Eu, que nunca fui poeta, não me lembro de quando é que vi o céu pela primeira vez, embora desconfie que, quando atentei na palavra “céu”, deva ter pensado que ela seria demasiado pequena para o que escondia. No meu frágil entendimento, “firmamento” representava melhor a abóboda que me cobria…

Por outro lado, à nascença, mais do que sujeito terei sido objecto. Fui  visto, e não sei com que olhos! Pressinto que o que de mim era esperado não seria muito diferente do destino dos homens daquele dia…

E ainda agora me parece que o céu é demasiado estreito e, no entanto, sinto que o firmamento substituiu melhor o ventre que durante algum tempo me acolheu.

Por isso, sempre que posso, olho o firmamento na esperança de adiar as contas com o céu.