15.6.17

Como se avizinha mais uma greve dos professores

Como se avizinha uma greve dos professores aos exames do dia 21 de Junho, deixo aqui meia dúzia de linhas sobre o sucesso da recente greve dos médicos.
Por aquilo que sei, milhares de doentes viram as consultas e as cirurgias adiadas. Pela experiência cá de casa, os pacientes, que, entretanto, não morreram, continuam à espera... Isto de morrer é, hoje, coisa de somenos!
No fundo, isto é, como nas guerras, as vítimas são esquecidas, enquanto os vencedores são efusivamente saudados. Ora, no caso da greve dos médicos, ainda não consegui vislumbrar quais foram as reivindicações que foram atendidas...
Sem querer extrapolar, creio que a greve dos professores insere-se na mesma lógica. Dar aos alunos mais um dia para estudar, enervar as famílias... e dizer à Nação que os sindicatos continuam vivos, capazes de mobilizar a classe, fazendo exigências, à partida, impossíveis de satisfazer, como essa da reforma aos 36 anos de serviço, sem penalização...
(Quem assim pensa, iniciou funções no ensino público, no dia 2 de janeiro de 1975... É só fazer as contas!)

Bom é que saibam...


«...e se queres recolher vontades, Blimunda, vai à procissão do Corpo de Deus, em tão numerosa multidão não hão de ser poucas as que se retirem, porque as procissões, bom é que saibam, são ocasiões em que as almas e os corpos se debilitam, a ponto de não serem capazes, sequer, de segurar as vontades, já o mesmo não sucede nas touradas, e também nos autos-de-fé, há neles e nelas um furor que torna mais fechadas as nuvens fechadas que as vontades são, mais fechadas e mais negras, é como na guerra, treva geral no interior dos homens.»
                            José Saramago, Memorial do Convento 

Anda por aí muito estudante que nunca viu uma procissão, e que, no caso de ter lido o impiedoso, terá ficado como uma representação deformada do espírito que anima as procissões dos dias que correm...
Portanto, ainda está a tempo de se deslocar à Baixa de modo a inteirar-se do cerimonial...
Há que pôr um pouco de ordem no caos para que vamos resvalando!

14.6.17

Luiz Pacheco entrevistado em 2004


Luiz José Gomes Machado Guerreiro Pacheco, 1925-2008.
(Entrevista ao Independente / 5 Nov. 2004)
Com quase 80 anos, a viver num quarto de um lar. 
Tem 8 filhos e 15 netos, que não conhece na totalidade. Está no lar desde 2001. Recusa ser operado à vista, por medo. Já não lê… Só vê sombras… Incontinente. O trajeto é só entre o quarto e a sala do lar… Vive de um subsídio de 120 contos, que teve medo de perder com “aquela gaja horrorosa, a Manuel Ferreira Leite”. Fica todo no lar. O subsídio terá tido a intermediação do Alçada Baptista…
Quis ser ferreiro, quis ser professor. Quis ir para a marinha mercante com o Cardoso Pires, mas nunca aprendeu a nadar. O máximo que teve foi quatro alunos em explicações.
Na Academia de Ciências foi uma desilusão - não havia convívio nenhum: éramos 10 rapazes e 100 ou 200 raparigas…
O grupo inicial de que fez parte: José-Augusto (França?), José Cardoso Pires, o Salazar Sampaio. Fizeram um jornal no Liceu (Camões) – o Pinguim, que teve três ou quatro números…
Considera que a sua actividade como editor foi mais relevante do que a de escritor…
Estórias: a da relação com uma menor de 14 anos, em casa de seus pais. Foi obrigado a casar. Ele tinha 17/18 anos… terá sido abusado sexualmente na infância; a história da ida às putas na Mouraria com um colega do Camões – eram ambos virgens: a prostituta comia uma maçã enquanto ia fazendo o serviço…
Quanto à pedofilia, não vê as crianças como inocentes, sobretudo as raparigas de 13 anos…
Desmente a sua relação homossexual com Mário Cesariny. Diz que isso é um mito, que não fez parte da lista dele.
Considera que em “O Libertino passeia por Braga” tudo é real – escrito em 1961, mas só publicado em 70…
Elogia o Salazar, o Cavaco, “isso é que eram bons primeiros-ministros, não era esta cambada- ” Santana Lopes, Paulo Portas. 
Foi salazarista, comunista… libertino... anarquista(?)

Rapidinhas

Agustina Bessa-Luís - Uma escritora a sério.

Lobo Antunes - Não leio há muito tempo.

Cardoso Pires - Um grande amigo.

Fernando Namora - Um aldrabão muito grande.

Natália Correia - Uma escritora um bocado falsa.

José Saramago - Um escritor de grande qualidade.

Sophia de Mello Breyner - Nunca li nada dela.

Herberto Hélder - Pensava que era melhor do que realmente era.

Mário Cesariny - Um artista que não ficará para a História.

13.6.17

Fernando Pessoa, nós e a Europa

«O que é preciso ter é, além de cultura, uma noção de meio internacional, de não ter a alma (ainda que obscuramente) limitada pela nacionalidade. Cultura não basta. É preciso ter a alma na Europa.
                                Fernando Pessoa (1912-1916)


Em rota de afastamento da Renascença Portuguesa, Fernando Pessoa indica o caminho, pois o Império já não tinha meios para se manter e ele sabia-o bem pois crescera no seio do Império britânico.
Um século depois, o Império desfez-se e o que falta cumprir de Portugal, apesar das vozes que o prolongam na "lingua portuguesa", só pode acontecer à escala global e, em particular, no interior da Europa...
E para isso, não basta migrar, é necessário que a alma se nutra dos valores universais, começando por participar ativamente na cultura europeia...
O que me aflige é que não vejo qualquer esforço dos responsáveis pela educação e pelo ensino para que tal aconteça... 
Continuamos longe da Europa e do Mundo. Por exemplo, quem é que conhece Juan Goytisolo, escritor espanhol falecido recentemente?

12.6.17

Eu não quero ser sobrinho!

Sobrinha do Presidente do PS contratada pela câmara de Lisboa.

Andam por aí tantos sobrinhos cujos tios não perdem oportunidade de lhes arranjar um emprego que eu decidi que não quero ser sobrinho nem mesmo dos meus tios. Espero que eles me perdoem!
Verdade seja dita que eu escolhi mal a família, pois não consta que os meus tios tenham sido sobrinhos de alguém influente, apesar de no Estado Novo haver mecanismos que possibilitavam a contratação de quem pertencesse à família dos CTT, da CP, da GNR...
Finalmente, os meus sobrinhos sabem há muito que não podem contar com a influência do tio, sem esquecer os meus filhos, também, eles vítimas deste meu horror ao nepotismo..., o que, até ao momento, me tem ficado muito caro.
Paciência!
(...)

Nem genro do eurodeputado Manuel dos Santos!

11.6.17

Música brasileira no pombal

Um grupo de brasileiros decidiu fazer um pique-nique num jardim resguardado, embora próximo de um pombal. O acesso dos carros ao jardim está, no entanto, impedido por pilaretes... De qualquer modo, isso não é obstáculo: os automóveis foram parqueados na retaguarda do pombal.
E como não há festa brasileira sem música, o último veículo foi transformado em cabine de som, lançando os sons tropicais a toda a largura do relvado...
Pessoalmente, detesto ruído - a música transforma-se em ruído, sempre que os meus tímpanos se revelam ofendidos... O que me preocupa, todavia, é o efeito que este concerto possa ter nas sinapses daquelas centenas de pombos que ali descansam...
Não sei se entre mim e os pombos há alguma semelhança, creio, contudo, que sim, pois, tal como eles vivem recatadamente naquele pombal, também eu cresci num ambiente em que a música suprema era o silêncio... o que, até à data, me tem trazido algumas incompreensões...
Fique claro que nada tenho contra a folia brasileira desde que ela respeite as criaturas de Deus.

10.6.17

Celebramos o quê?

Afinal, o que é que celebramos? A morte ou a vida? A morte do império, da nação? Ou o sentido de pertença a um possível espaço nostálgico de lusofonia? 
Provavelmente, corremos para a outra margem do Atlântico, arrependidos de lhe termos virado as costas e nos termos deixado embalar pelas sereias da Europa...
...  sereias luzentes e de oiro.
(...)
Aqui, por Lisboa, também celebramos o António que virou as costas ao oiro e ao ruído, mas que, na verdade, fantasiamos casamenteiro e boémio... As marchas de António eram forçadas, extenuantes por causas que nada deviam à folia, à vaidade e ao poder...