20.1.10

Do amor à pátria…


Nas primeiras páginas do Contrato Sentimental, de Lídia Jorge, encontro um poema do mexicano José Emílio Pacheco que começa por afirmar «Não amo a minha pátria. / O seu fulgor abstracto inacessível. / Porém (ainda que soe mal) daria a minha vida/ Por dez dos seus lugares, certas pessoas…». A leitora, Lídia Jorge acaba por desenvolver a ideia de J.E.P., no conjunto de textos em que nos convida a apostar no Portugal futuro, mesmo que isso signifique romper com o Portugal expansionista e colonizador… Involuntariamente, penso no verso de Pessoa /Reis "Prefiro rosas à pátria, meu amor." E também nas Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, de Antero de Quental, ciente de que a Lídia Jorge falta a competência argumentativa de Antero e a subtileza interpretativa de Eduardo Lourenço, sem esquecer o messianismo luminoso de António Quadros…
Nesta deriva comparativa, começo a ler As Batalhas do Deserto, de José Emílio Pacheco, desperto para um critério de leitura de Rosa Montero que divide os autores em memoriosos e amnésicos. Dicotomia que me agrada, pois, sem ser autor, não deixo de me situar do lado daqueles (os amnésicos) que "não querem ou não podem recordar; certamente fogem da sua própria infância e a sua memória é como um quadro mal apagado."
A esta hora, decido não falar da surpresa que é ler As Batalhas do Deserto, porque, de facto, estou a reler Cão Como Nós, de Manuel Alegre e a pensar no modo como o candidato à Presidência da República conjuga: cão como nós / cão como tu / cão é cão. E também não vou concluir a reflexão, porque Sarah Kane me está a recordar que antes de adormecer ainda devo terminar a leitura da peça RUÍNAS.

17.1.10

Os novos lugares

Os novos espaços escondem e revelam. A memória do passado fica em quem ali trabalhou, uma memória de guerra, colonial, em nome de uma pátria indivisa e sobranceira. Talvez, convenha esquecer essa pátria que colapsou nos anos 70 do século passado! A dinamite serve agora para abrir as fundações do futuro, em condomínio fechado, apesar de alguns equipamentos sociais – as famigeradas contrapartidas do negócio! Com vista para a ponte Vasco da Gama, as gruas, desajeitadas, suportam o peso dos materiais e da ambição humana, libertando os novos escravos para tarefas menos árduas ou simplesmente para o desemprego permanente, para a indigência…

Na nova pátria, os polícias continuam a autuar os condutores incautos, indiferentes aos veículos estacionados na mesma rotunda. Os outdoors convidam-nos ao aconchego evasivo da fantasia. O verde estende um breve tapete do que foram hortas vicejantes e auto-suficientes. Os candeeiros, inúteis a esta hora do dia, anseiam pela penumbra que lhes devolva a razão…

E eu, simplesmente, caminho a pensar que a professora Amélia Lopes acaba de fazer um diagnóstico arrasador do insucesso escolar em Portugal: “Mais velho, mais qualificado e maioritariamente do sexo feminino” o docente perdeu o pé… Quem precisa de experiência, de exigência, de compreensão nesta nova pátria?

De facto, o rejuvenescimento esconde o passado. E eu continuo a deambular, evitando falar de Cesário Verde, não vá ferir a epiderme dos nautas do presente.

16.1.10

Sem glória nem grandeza…

Junto ao Tejo 021

Outrora, os imperadores romanos, vitoriosos, mandavam erguer monumentos para inscrever o seu nome na História. Napoleão, imperador, em 1806, também, não resistiu a essa pequena vaidade.

Hoje, deparei com um Arco do Triunfo no Museu da Electricidade. Felizmente, é de plástico! E por perto não avistei qualquer imperador. Só pescadores de rio, ciclistas de fim-de semana e casais de meia-idade. O Sol escondera-se, envergonhado de ainda haver quem o queira ofuscar com o poliéster.

15.1.10

Haja Inverno na terra, não na mente. (FP/Ricardo Reis)

O forte sismo (7.0 na escala de Richter) que atingiu o Haiti terá feito mais de 100 mil mortos. A ilha caraibenha virou cenário de destruição quase total.

 

Os mercados de Wall Street fecharam em queda, penalizados pelos títulos da banca, após divulgação dos resultados do JP Morgan, cujas receitas ficaram abaixo do previsto.

O ex-deputado socialista Manuel Alegre afirmou hoje estar disponível para ser candidato da esquerda às próximas eleições presidenciais que acontecem em 2011.

O apelo de Cavaco Silva ao consenso partidário na redução do défice e da dívida externa teve respaldo no Governo.

Quase um mês depois, Amado e Reis cruzaram-se num acto social no Palácio de Belém. Luís Amado cumprimentou Carlos Reis e convidou-o para almoçar. «O convite nunca se confirmou».

A tragédia do Haiti não afecta os mercados financeiros mundiais!

A tragédia do Haiti não afecta a disponibilidade do providente Manuel Alegre!

A tragédia do Haiti não afecta o orçamento português!

A tragédia do Haiti não afecta os ajustes de contas!

Nem a tragédia do Haiti nos faz parar e pensar!

Ficamos, no entanto, a saber que, quando um forte sismo atingir Portugal:

  • Os mercados financeiros mundiais não serão afectados;
  • A disponibilidade do providente Manuel Alegre não nos terá feito sair do desnorte em que vivemos;
  • O orçamento português de 2010 (nem dos anos seguintes) nada dirá quanto à obrigação de afectar recursos para (re) construir as nossas aldeias, vilas e cidades em bases mais seguras;
  • Os Reis e os Amados continuarão emplumados.

 

14.1.10

Amanhã, como será?

 Hoje, o “DN JOVEM” voltou à Escola. E explicou qual foi e pode ser o papel de um suplemento literário: dar voz a quem a não tem; dar voz a quem a procura; dar voz às pulsões mais recônditas; colocar em rede vozes longínquas e diversas; afrontar códigos cristalizados; dar a iniciativa à juventude…

13.1.10

Barreiras à solta…

 

Se quiser salvar uma língua de prestígio como o francês, ameace com a oferta do espanhol. A língua vizinha assusta! Parece que esta língua deixou de estar à altura do "século do ouro"! Ter-se-á tornado numa língua "demasiado fácil"?!

Como é que medimos o prestígio de uma língua?

(Um ministro português afirmou recentemente que a língua portuguesa vale 17% do PIB.) Seria interessante saber quanto valem a s outras línguas para os respectivos países.

 

Ainda fará sentido temer a Espanha? O medo é um instrumento facilmente manipulável. Sobretudo, quando a comunicação entre os povos é escassa. E a comunicação autêntica só é possível na língua, neste caso, nas línguas – portuguesa e espanhola – gerando um salutar e próspero bilinguismo.

Considerando as nações que constituem a Ibéria, uma educação plurilingue e intercultural deveria assentar no bilinguismo e no biculturalismo, quer falemos de Portugal, da Galiza, da Catalunha, do País Basco… ou de Castela…

Haverá ainda quem acredite numa economia pujante em Portugal sem a cooperação com Espanha?

E se a estratégia de recuperação económica passar por Espanha, que língua devemos utilizar? - O Inglês? Um novo crioulo?

 

 

 

12.1.10

Desafios

Responsável involuntário por um departamento curricular de línguas, interrogo-me sobre o que fazer com ele. Um departamento, histórica e geneticamente, dividido. Aparentemente, o primeiro objectivo seria eliminar a fronteira, gerando estratégias de socialização…

No entanto, sinto que o legislador ao criar esta estrutura procurou criar relações hierárquicas em vez de desencadear processos cooperativos…

E por isso creio que a única forma de combater aquele propósito passa por colocar o departamento ao serviço do aluno, procurando contribuir para a sua educação plurilingue e intercultural.

Neste sentido, proponho que sejam desenhadas duas novas estratégias: - uma plurilinguística e outra literária.

O departamento deverá, doravante, apostar estrategicamente na oferta plurilingue: Latim; Português; Português Língua Não Materna; Espanhol; Francês; Inglês e Alemão… Assim como deverá apostar na educação literária, nas dimensões europeia, lusófona e local.

Assim, não só o departamento curricular de línguas poderá vir a oferecer novas disciplinas como, talvez, necessite de repensar a sua oferta no que se refere à área de projecto.

E para que estas ideias possam ser inscritas nos projectos educativo e curricular da escola é necessário encontrar quem queira, em equipa, levá-las à prática…