18.7.13

A insuficiência

No tempo pós-moderno, o conceito "insuficiência" serve para albergar uma grande variedade de medos. Deixando de parte a enumeração desses medos, vale a pena, no entanto, pensar nas causas desse estado de insuficiência em que vamos mergulhando.
Na minha opinião, a causa primeira está no tipo de homem que hoje nos governa e que me atrevo a designar como homem de plástico.
Como material, o plástico pode, de forma mais económica, substituir todos os outros materiais, mas revela um enorme defeito é altamente nocivo, pois a sua lenta dissolução só traz prejuízo. Por outro lado, no interior do plástico esconde-se o vazio, o isolamento, o medo, o que lhe traz uma falsa segurança, uma falsa certeza...
Hoje, ouvi vários políticos de renome, alguns já insuflados, colocarem os interesses dos partidos à frente do bem comum. E fiquei a pensar se a matéria de que eram feitos os fundadores da democracia não terá sida enxertada com algum garfo de plástico.

17.7.13

Nos nossos círculos

Nos nossos círculos, não faltam pessoas a quem é negada a possibilidade de ganhar um euro por dia! Um euro por dia!
Entretanto, há quem diga que o presidente da república vai gastar 150.000 euros na deslocação às Selvagens. 150.000€ por um dia e meio!
Por outro lado, consta que, amanhã, os diretores das escolas públicas deste país vão deslocar-se a Torres Novas para visionarem um power point sobre a organização do próximo ano letivo. Quanto custará este evento ao erário público? Será que não é possível enviar o «power point» por correio eletrónico?
Nos nossos círculos, já deixou de fazer sentido debater o corte de 4800 milhões de euros, pois, a cada dia que passa, o desperdício cresce. Basta observar os mercedes que circulam entre as sedes partidárias a procurar acordo sobre o modo como implementar o corte de 4800 milhões de euros imposto pela Troika, e não pelo PSD ou pelo CDS.
E de nada serve ao PS acusar a coligação de querer impor o corte, pois a culpa é, em primeiro lugar, "socialista"...
E quanto ao corte, não creio que seja difícil fazê-lo. Basta que os governantes prescindam de férias, de ajudas de custo, de automóveis topo de gama, de deslocações desnecessárias, das  frívolas comodidades, e passem a utilizar os escassos recursos com parcimónia.
Se houvesse um sinal, o caminho seria menos difícil e menos demorado!

16.7.13

Exame de Português: "O país sonhado" por D. Miguel Forjaz

Em nome do ARDOR PATRIÓTICO, «ameaçado pelos inimigos de dentro», D. Miguel quer «os sinos das aldeias a tocar a rebate, os tambores em fanfarra, nas paradas dos quartéis, os frades aos gritos nos púlpitos, uma bandeira na mão de cada aldeão.»
Para o «consciencioso governador do reino»: « Portugueses: A hora não é para contemplações! Sacrifiquemos tudo, mesmo as nossas consciências, no altar da Pátria.»
E na perspetiva de Miguel Forjaz,  o país atingirá o clímax quando «Lisboa (...) cheirar toda a noite a carne assada (...) e o cheiro ficar na memória durante muito anos (...) Felizmente há luar...
Sempre que pensarmos em discutir as ordens dos conscienciosos governadores, lembrar-nos-emos do cheiro da carne do General...
(118 palavras)
Infelizmente, há sonhadores que transformam a nossa vida num pesadelo!

15.7.13

Da certeza à incerteza

Os tempos são de incerteza! Os dispositivos de controlo vêm sendo desmantelados um a um e substituídos pela crença de que a certeza poderá regressar, apesar da capacidade para repor ou aniquilar a certeza ter origem externa.
Nos últimos dias, o presidente da república, em nome do interesse externo, voltou-se para o arco da governação e exigiu  acordo sobre "três pilares". O edifício pareceu-me coxo! Sempre ouvira falar dos 4 doutores latinos da Igreja e até dos 4 doutores gregos da Igreja. E mais recentemente, lembro-me que, na China, "o bando dos 4" teve um papel importante na radicalização do maoísmo, espalhando, no entanto, a incerteza.
A ideia de construir um acordo sobre um tripé é certamente uma forma de dar expressão à incerteza. Mas tudo isto só pode resultar do contágio dos três pilares que constituem a Troika que, como todos sabemos, se encarregou de destruir todas as nossas certezas.
Curiosamente, a "incerteza", com as suas quatro sílabas é muito mais sólida, mais românica do que a gótica "certeza". 
Entretanto, o nosso presidente da república, nestes tempos de incerteza, vai acompanhar uma missão científica, em pleno Atlântico, regressando na sexta-feira com a certeza de que, afinal, lhe faltava o pilar da lucidez. Se tal tiver acontecido, em vez de marcar eleições legislativas, anunciará eleições presidenciais. E já para setembro! 

13.7.13

Os resultados dos exames nacionais

Os resultados dos exames nacionais são medíocres e só podem espantar quem anda distraído do desmantelamento a que o sistema educativo tem sido submetido.
a) O GAVE iniciou, na última década, um processo de condicionamento da metodologia de ensino cujo resultado mais evidente é a regulação do raciocínio com a inevitável eliminação da criatividade: professores e manuais submetem-se incondicionalmente à formatação do avaliador. Por exemplo, para que é que servem os Testes intermédios? No entendimento do GAVE, o sucesso escolar depende do treino, sem perceber que este não é suficiente para resolver problemas surgidos em novas situações...
b) Na mesma linha, o Ministro da Educação aposta no reforço da carga letiva, com o claro objetivo de dar mais tempo de treino aos alunos. Por exemplo, qual foi efeito da atribuição de mais 45 minutos à disciplina de Português no presente ano letivo? A média nacional, para além de ser negativa, ainda baixou?
c) Quando se analisa com seriedade o problema, é bem visível que a formação e a atualização dos professores sofreram um sério revés nos últimos anos. A maior parte da formação disponível não passa de um negócio que os professores estão obrigados a pagar em troca de uns míseros créditos que não servem para coisa nenhuma.
d) A mudança dos modelos de avaliação dos docentes, em nome de uma melhoria da qualidade da prática letiva, resulta mais da necessidade de dar ocupação a novas clientelas partidárias geradas nas universidades privadas do que de uma verdadeira estratégia para melhorar a qualidade do ensino. Enquanto os novos "doutores" não se instalam na engrenagem, o MEC força os professores a desempenharem tarefas de avaliação interna e externa para as quais não têm formação. A atribuição da coordenação da avaliação docente simultaneamente a diretores de escolas e a coordenadores de centros de formação em nada contribui para a uniformização de procedimentos, sem falar na DGAE que nem uma base de dados consegue incrementar para gerir todo o processo.
e) É bom de ver que, no que fica dito, há um conjunto de fatores de dispersão incompatíveis com a gestão de 4 ou 5 turmas, a 28/30 alunos. E não  é apenas o MEC que gera dispersão, o Plano Anual de Atividades é, em muitas escolas, obstáculo ao sucesso do ensino e da aprendizagem. 
f) A aposta na aposentação precoce de milhares de professores, para além de os enganar pois lhes frusta as expetativas de vida mais ou menos desafogada, provoca uma verdadeira "descapitalização docente" nas escolas. A experiência de muitos anos e a disponibilidade (art.º79) permitiam recuperar muitos alunos que, de outro modo, estavam condenados ao insucesso.
g) Na verdade, desde 2005, os sucessivos governos, ao contrário do que proclamavam, apostaram: na degradação da imagem do professor junto da opinião pública; na degradação salarial, porque, para além de congelarem as progressões, submeteram os vencimentos a sucessivos cortes; na degradação do mérito e da experiência... Por outro lado, a política de agregação e de agrupamento de escolas trouxe maior dispersão e, sobretudo, maior animosidade entre docentes, funcionários, alunos, pais e encarregados de educação...
h) Portanto, desta vez, o insucesso não deve ser atribuído, em primeiro lugar, aos alunos, pois a causa está do lado da política educativa ou da falta dela.    
 
     

12.7.13

A cobra e o espelho

As cobras podem mudar de pele de dois em dois meses. Se a cobra estiver ferida poderá acelerar essa mudança para reparar os "danos".
 
O discurso político surge de tal modo repleto de contradições, de inverdades e/ou mentiras, de palhaços sem máscara , de lapsos, redundantemente, involuntários, de zangas de ocasião que ficamos sem saber se o locutor de hoje ainda é o mesmo ontem.
Ao contrário do que se possa pensar, apesar do tempo ser de empobrecimento, chegou a vez da classe política ser pós-moderna, abrindo mão da construção da identidade pessoal, da identidade nacional e transnacional. 
Esta opção tem efeitos desestruturantes que desmantelam os indivíduos, as famílias, as nações... Por isso é fácil encontrar quem não se importe que ponham a causa a sua reputação - Paulo Portas, exemplo do momento.
Ora quem proclama que não se importa de hipotecar a sua reputação é quem procura livrar-se da respetiva identidade, pois a pedra de toque da vida pós-moderna não é a construção da identidade, mas a prevenção da fixação.(Zygmunt Bauman)
O político da moda mais não faz do que imitar a cobra ao desfazer-se da pele. Só que ele não procura sarar os "danos", porque ele tem horror à fixação que o espelho insiste em devolver-lhe... Espelho meu, haverá alguém mais horrendo do que eu?

11.7.13

O tempo já não é um rio...

I - Consta que a média nacional do exame de Literatura Portuguesa foi 10,5. Os meus alunos, pouco vocacionados para a Leitura e, consequentemente, para a Literatura, obtiveram uma média de 11,95. Pode parecer um bom resultado, mas, para mim, é um indicador de mediocridade e que legitima a decisão de não voltar a lecionar esta disciplina no ensino secundário.
E se este argumento não fosse suficiente, acabo de encontrar dois outros que, talvez, justifiquem o desencanto dos jovens desenraizados: « O tempo já não é um rio, mas uma coleção de pântanos e tanques de água.» E esta ideia é suportada por uma reflexão de George Steiner sobre os valores a admirar e a visar ativamente num mundo em que se procura « o impacto máximo e a obsolescência imediata
A Literatura é uma forma de enraizamento, de perenidade, de identidade, e não subsiste sem a duração, sem a história da duração, sem o rio em que a avezinha se despenha para ser arrastada para a foz ou alapada nalgum escolho. 
Perante isto, tomo, agora, consciência de que se quisesse continuar a ensinar Literatura teria que passar a visitar os pântanos, ciente de que a experiência seria nauseabunda, embora passageira, pois essa visita estaria condicionada por um mecanismo que a tornaria anacrónica, disfórica e inútil.
 
II - Andando o ministro da educação tão preocupado com as disciplinas estruturantes,  como é que se explica que a média nacional da disciplina de Português (12º ano) tenha baixado precisamente no ano em que a carga horária foi aumentada em 45 minutos?