22.7.13

Fotografar é disparar

Fotografar exige o olhar, mas olhar não é ver. No fotografar, o instantâneo é um disparo. (Fonte: Erich Fromm, The Anatomy of Human Destructiveness, 1974)

Nestes últimos dias, só disparei uma vez! Fixei-me na curva apertada que abre para o horizonte sadino. Quando olhei, procurei a linha de água e o resto da muralha do castelo, e a maior parte dos indicadores desprenderam-se dos olhos, talvez, para que mais tarde eu pudesse analisar cada um deles. E com tempo, porque sem ele não é possível destrinçar os elementos, observar-lhe a posição, a cor, o volume: devolver-lhe o espaço engolido pela pressa.

Ver exige paciência, concentração, interesse, abertura interior. Ora, antes de disparar, gastei umas tantas horas a classificar provas de exame, para concluir que poucos são os alunos que veem. Basta relembrar que encontrei cavaleiros medievais, sentados em esplanadas de café, a contemplar ociosas donzelas que passavam sem lhes dar atenção, ou que no conto “A Importância da Risca do Cabelo”, de José Rodrigues Miguéis ninguém identificou um pingo de IRONIA ao retratar o Mansinho. Repito: o Mansinho!

Na verdade, o mais fácil é disparar! 

/MCG

21.7.13

O planalto pariu um coelho

De nada serviu Cavaco ter subido ao planalto da Selvagem! Moisés subira à montanha e trouxera as tábuas da lei que durante séculos orientaram o povo hebraico. Cavaco não só não trouxe nova lei como não conseguiu sequer caçar novo coelho!
Hoje, ao 9º minuto da sua preleção, voltou a servir-nos coelho requentado.
Consta, entretanto, que a crise custou 6 milhões de euros. Gosto da precisão, mas não entendo como é que, sendo tão rigorosos, não conseguimos identificar os fautores e responsabilizá-los.
(...)
Neste fim de semana, no que me diz respeito, ocupei o tempo de crise, como muitos outros professores, a classificar provas de exame, sem esperar qualquer gratificação. Já lá vai o tempo!
E claro, estive atento ao comentário do diretor do GAVE que, sem pudor, atacou a Associação de Professores de Geografia, acusando-a de esgrimir argumentos sem o «mínimo de rigor», porque esta pusera em causa a formulação de vários itens da prova da 1ª fase. O douto diretor, em vez de mandar analisar os ditos itens, disparou contra os alunos, pois, nos últimos anos, de acordo com a análise estatística (a safada!), estes continuam a mostrar dificuldades «na leitura inferencial, na capacidade de escrita, em particular na capacidade para a produção de discursos estruturados, coerentes...» 
Onde é que já vimos este argumento? O senhor diretor já deveria ter compreendido que o problema não é de natureza geográfica. Apesar de transversal, a escrita, nas atuais condições, acaba por ser diminuída nas aulas de Português, nos testes de Português, nos exames de Português...
Chegados aqui, o problema já não pode ser resolvido pelo diretor do GAVE. Compete ao Ministro da Educação ordenar um inquérito aos exames nacionais e tirar as devidas ilações...
(Fonte: Público, Domingo 21 Julho 2013)   

20.7.13

Um presidente ausente

Escrever um pouco mais, mas para quê? As epístolas só interessam a anacoretas! As cartas não resistem à busca absoluta e volátil de sensações... a poesia nem digestivo consegue ser! E quando a arte morre, o romance espera a sua vez: abre-se o contentor e, sem aviso, lá vai lixo, em bruto!
Claro que ainda sobram uns tantos vagabundos de sensações, mas estes não trocam o esgotamento pelo portátil...
É como se o presente fosse apenas duração: O presidente dirige-se ao país amanhã! E porque não hoje? Ficamos à espera da palavra redentora que já sabemos que não existe... em vez da epístola sagrada, da carta de amor ou de desagravo, do ópio da poesia, da plasticidade romanesca, suspensos, estamos à espera que o presidente puxe a cavilha à granada.
 
Poder-se-ia escrever sobre a causa da crise, mas ninguém quer assumir a responsabilidade, porém ela é de todos!
E se alguém escreve e eu não o confesso, não é porque queira faltar à verdade, nem porque Deus tenha deixado de contar comigo para seu porta-voz, mas porque me afastei para longe das cartas que circulam um pouco por toda a parte a confessar a culpa alheia.
Entretanto, vou esperar pelo próximo prefácio do presidente para saber se, afinal, a culpa da crise é, apenas, minha.

PS. Decidi mudar o título "Um presidente sem presente" porque o presidente tem presente, nós é que não. Na verdade, o presidente subiu ao planalto da Selvagem para se distanciar de nós, para se ausentar de nós. Quando o presidente se nos dirige é da "ilha afortunada" onde passou a viver, apesar do tom plangente, de facto, distante...
  
 
 

19.7.13

A inconveniente incerteza

Já várias vezes, aqui, referi que os tempos são de incerteza e que por isso ela tornou-se um lugar comum. Por outro lado, também, aqui, escrevi, que, desde 2011, o Governo vem espalhando a incerteza sem que tal sementeira o incomode por aí além. Pelo contrário, o medo resultante da incerteza tornou-se numa forma cómoda de domesticar a revolta. 
Entretanto, o inefável Passos vem agora acusar o presidente da república de atiçar a incerteza ao anunciar eleições legislativas a partir de junho de 2014. Num improviso néscio, Passos consegue mesmo afirmar que não há nada mais incerto do que o resultado de umas eleições...
O argumento mostra como o senhor primeiro-ministro não sabe qual é o efeito de não encontrar emprego, de perder o emprego, não sabe qual é o efeito do desmantelamento das poucas certezas que restavam aos aposentados, reformados e pensionistas, aos funcionários públicos e trabalhadores em geral.

18.7.13

A insuficiência

No tempo pós-moderno, o conceito "insuficiência" serve para albergar uma grande variedade de medos. Deixando de parte a enumeração desses medos, vale a pena, no entanto, pensar nas causas desse estado de insuficiência em que vamos mergulhando.
Na minha opinião, a causa primeira está no tipo de homem que hoje nos governa e que me atrevo a designar como homem de plástico.
Como material, o plástico pode, de forma mais económica, substituir todos os outros materiais, mas revela um enorme defeito é altamente nocivo, pois a sua lenta dissolução só traz prejuízo. Por outro lado, no interior do plástico esconde-se o vazio, o isolamento, o medo, o que lhe traz uma falsa segurança, uma falsa certeza...
Hoje, ouvi vários políticos de renome, alguns já insuflados, colocarem os interesses dos partidos à frente do bem comum. E fiquei a pensar se a matéria de que eram feitos os fundadores da democracia não terá sida enxertada com algum garfo de plástico.

17.7.13

Nos nossos círculos

Nos nossos círculos, não faltam pessoas a quem é negada a possibilidade de ganhar um euro por dia! Um euro por dia!
Entretanto, há quem diga que o presidente da república vai gastar 150.000 euros na deslocação às Selvagens. 150.000€ por um dia e meio!
Por outro lado, consta que, amanhã, os diretores das escolas públicas deste país vão deslocar-se a Torres Novas para visionarem um power point sobre a organização do próximo ano letivo. Quanto custará este evento ao erário público? Será que não é possível enviar o «power point» por correio eletrónico?
Nos nossos círculos, já deixou de fazer sentido debater o corte de 4800 milhões de euros, pois, a cada dia que passa, o desperdício cresce. Basta observar os mercedes que circulam entre as sedes partidárias a procurar acordo sobre o modo como implementar o corte de 4800 milhões de euros imposto pela Troika, e não pelo PSD ou pelo CDS.
E de nada serve ao PS acusar a coligação de querer impor o corte, pois a culpa é, em primeiro lugar, "socialista"...
E quanto ao corte, não creio que seja difícil fazê-lo. Basta que os governantes prescindam de férias, de ajudas de custo, de automóveis topo de gama, de deslocações desnecessárias, das  frívolas comodidades, e passem a utilizar os escassos recursos com parcimónia.
Se houvesse um sinal, o caminho seria menos difícil e menos demorado!

16.7.13

Exame de Português: "O país sonhado" por D. Miguel Forjaz

Em nome do ARDOR PATRIÓTICO, «ameaçado pelos inimigos de dentro», D. Miguel quer «os sinos das aldeias a tocar a rebate, os tambores em fanfarra, nas paradas dos quartéis, os frades aos gritos nos púlpitos, uma bandeira na mão de cada aldeão.»
Para o «consciencioso governador do reino»: « Portugueses: A hora não é para contemplações! Sacrifiquemos tudo, mesmo as nossas consciências, no altar da Pátria.»
E na perspetiva de Miguel Forjaz,  o país atingirá o clímax quando «Lisboa (...) cheirar toda a noite a carne assada (...) e o cheiro ficar na memória durante muito anos (...) Felizmente há luar...
Sempre que pensarmos em discutir as ordens dos conscienciosos governadores, lembrar-nos-emos do cheiro da carne do General...
(118 palavras)
Infelizmente, há sonhadores que transformam a nossa vida num pesadelo!