22.11.16

Da variante africana da língua portuguesa

Na questão das variantes da língua portuguesa, começo a interrogar-me se fará sentido ensinar que há uma variante africana, designação tão genérica que pouca informação nos conseguirá dar sobre o verdadeiro resultado do contacto do português com as línguas locais.
Em territórios extensos e distantes, polvilhados de culturas diferentes, só um estado despótico poderia realizar a homogeneização da expressão dos cidadãos... Como bem sabemos, nem em todos os territórios, tradicionalmente, considerados de expressão portuguesa, há estados, democráticos ou despóticos, capazes  de assegurar a escolarização das populações...   
E mesmo que cada estado conseguisse definir uma política da língua, nunca o faria em nome de uma entidade abstrata, no caso a variante africana.
(...)
Entretanto, em Portugal, os jovens de 15 / 16 anos, que supostamente dominam a variante europeia, vão confessando, por exemplo, ao ler Ondjaki, que compreendem e falam quotidianamente a língua d' "Os Da Minha Rua"...
O que me deixa a pensar que a distante e polvilhada rua africana desagua cada vez mais nas nossas escolas, europeias e portuguesas, sem ser necessário pisar solo africano. Mas fá-lo num registo muito empobrecedor!
(...) Quanto à variante brasileira, o melhor é começar a gravar os «papos» nos centros comerciais, nos cabeleireiros, nos bares e nas fachadas dos prédios...

21.11.16

Nem sei como explicá-lo

Nem sei como explicá-lo, mas é como se o  tempo pudesse ser representado por uma casca espessa, cheia de nós cada vez mais difíceis de interpretar e, em simultâneo, por uma película tão fina que não suporta qualquer enraizamento...
Por mais que se insista que a árvore tem raízes milenares, que é necessário observar o seu crescimento e ramificação, a verdade, mesmo se provisória, é que a folha se move ao sabor da chuva e do vento, à mercê do frio e do calor.
Por um instante, a película parece ganhar consistência, mas rapidamente se perde na confusão dos dias.
Li, há uns minutos, um queixume sobre o ocaso dos amigos, e não pude deixar de pensar que a história de cada vida se assemelha ao curso da folha que já nem o rouxinol ousa travar.  

20.11.16

Impossível, hoje!

«As viagens são consideradas geralmente como sendo uma deslocação no espaço. É pouco. Uma viagem inscreve-se simultaneamente no espaço, no tempo e na hierarquia social.» Claude Lévi Strauss, Tristes Trópicos

A sucessão de lugares, a vertigem do percurso, o tempo insuficiente para encurtar a distância, como se os intervalos nada pudessem contar, apenas dourados estéreis fastidiosos - a viagem...
O espaço só ganhava consistência se houvesse um pouco mais de tempo - raro. Impossível, hoje! E quando espaço e tempo confluíam, isso significava, por um lado, mais folga financeira e, por outro lado, descoberta de desnivelamento social - de desigualdade.
Por aqui, é a bananeira que expõe um cacho de bananas contra a chuva e contra o frio, insistindo numa viagem condenada ao malogro...
Acolá, é a Fundação Calouste Gulbenkian que mostra As Linhas do Tempo que a regem, como se a viagem pudesse ser nossa (1986-1956-2016). A entrada é livre e gratuita!
O difícil é ficar indiferente à riqueza que permite este festim do gosto que inebria e que convida à viagem...
Por mim, hoje, o meu pensamento está com a bananeira...

19.11.16

Na praça José Fontana

O projeto assenta em 38 turmas. Hoje, as turmas são 42. O espaço é o mesmo - consequência: as salas vão aumentar de área, podendo, assim, aumentar o número de alunos... ou, pelo, contrário, as salas vão diminuir de área, de modo a criar gabinetes de trabalho...
Diz-se que o investimento é de 12 milhões de euros para escorar o edifício, modernizá-lo e, pelos vistos, deitar umas salas abaixo. Ou não será nada disto?
Há uns anos, o investimento era de 20 milhões para escorar o edifício, acrescentá-lo, em pisos e salas. O acréscimo não causava problema, o que incomodou muita gente foi a vintena de plátanos que insistem em florescer nos pátios...
Desconfio que daqui a uns anos, nada disto será problema. O tempo tudo cura!   

18.11.16

O Deus deste dia é brasileiro!


Para que diacho fui eu colocar-me "entre ruínas"?
Deus não perdoa! Na sua sapiência infinita, entra por este blogue e provoca-me, acusando-me de não o acolher devidamente - afinal, ele espera que eu lhe solicite ajuda...
Desconfio que o Deus deste dia é brasileiro: os pronomes não enganam (você / seu)... sem esquecer o "relacionamento".
Pessoalmente, preferia estar numa 'relação' com um Deus que me ajudasse desinteressadamente. Afinal, não sou eu que o impeço de cumprir a sua missão.

17.11.16

Por entre ruínas

«A verdade é sempre provisória.» José Fernandes Fafe, A colonização portuguesa e a emergência do Brasil, Círculo de Leitores, Temas e Debates, 2010.

Se a verdade é sempre provisória, o que dizer da mentira?
Provavelmente que, com o tempo, o que era certo deixa de o ser.
Talvez tenha sido por isso que inventaram as religiões - a melhor maneira de contrariar a ideia de que a "morte é certa"...
Dizem-me que os Estados Unidos da América prosperaram porque a religião calvinista admitia que o capital seria a chave da redenção do indivíduo...
Dizem-me, também, que o Brasil se atrasou na redenção capitalista, porque a religião católica sempre foi um entrave ao sucesso da pessoa, porque esta vivia vigiada pelo dogma de fonte divina... isto é, romana...
Por mim, que nada sei, espanta-me que, em 2017, Estados Unidos e Brasil possam vir a viver em convulsão permanente, como parecem anunciar os apelos à guarda pretoriana.

E nós, por aqui, na boca do túnel, por entre ruínas...

16.11.16

Os professores bestiais são raros!

«Basta que (...) para que, nas carteiras, os olhos adquiram outro brilho e o silêncio se torne explicitamente natural e fecundo.» Mário Dionísio
 
Já não basta que o professor se afaste do conteúdo a memorizar ou da resposta a dar!
Logo que as raízes procure explicitar, a interrupção é inevitável " mas isso é história", "mas isso é português antigo ou nem isso - latim, talvez!".
Logo que procure explicar que o nome próprio contém uma história por achar, uma responsabilidade acrescida, um sentido de pertença a não alienar, o silêncio que nunca chegou a ser desfaz-se em grunhidos e em sorrisos gulosos...
Logo que pressinta que tem que voltar a explicar que a comparação são dois termos em que a substância do segundo serve para dar conta da bestialidade do primeiro, alvoroçam-se as mochilas e vão "sa via"  / ou à sua vidinha.
(...)
Para tudo há uma explicação: - os professores bestiais são raros!