I (Fernando Pessoa)
Leram-me hoje S. Francisco de
Assis.
Leram-me e pasmei.
Como é que um homem que gostava
tanto das coisas,
Nunca olhava para elas, não
sabia o que elas eram?
Para que havia de chamar minha
irmã à água, se ela não é minha irmã?
Para a sentir melhor?
Sinto-a melhor bebendo-a do que
chamando-lhe qualquer coisa.
Irmã, ou mãe, ou filha.
A água é a água e é bela por
isso.
Se eu lhe chamar minha irmã,
Ao chamar-lhe minha irmã, vejo
que o não é
E que se ela é a água o melhor é
chamar-lhe água;
Ou, melhor ainda, não lhe chamar
coisa nenhuma,
Mas bebê-la, senti-la nos
pulsos, olhar para ela
E isto sem nome nenhum.
Alberto
Caeiro, 21-5-1917
1.
Explicite a causa e os motivos do espanto do
sujeito poético.
2.
Transcreva duas interrogações retóricas, expondo
a intencionalidade de cada uma delas.
3. Mostre como é que Alberto Caeiro fundamenta a sua atitude perante as coisas (a realidade).
1. 4. Depois de ler o poema, elabore um texto, entre 80 e 130
palavras, que explicite a reflexão do Poeta sobre a sua vida.
A
criança que fui chora na estrada.
Deixei-a
ali quando vim ser quem sou;
Mas
hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero
ir buscar quem fui onde ficou.
Ah,
como hei de encontrá-lo? Quem errou
A
vinda tem a regressão errada.
Já
não sei de onde vim nem onde estou.
De
o não saber, minha alma está parada.
Se
ao menos atingir neste lugar
Um
alto monte, de onde possa enfim
O
que esqueci, olhando-o, relembrar,
Na
ausência, ao menos, saberei de mim,
E,
ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.
Fernando
Pessoa, 22-09-1933
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