14.10.14

Cronopoemas de António Souto - Sonhos Sobrantes

Abri o livro do poeta e, para tal, suspendi o amigo e o colega de trabalho. Comecei por ler o prefácio e achei-o redutor. O poeta tutelado por Ricardo Reis sabia-me a pouco!
Avancei, não de forma linear. Atrevi-me a desrespeitar a composição. Conheço bem os malefícios da retórica!
E, de súbito, os poemas começaram a saber-me a tempo - um tempinho de luz -, o único tempo de plenitude que um poeta pode saborear.
E do longe e do perto, numa escrita límpida, depurada, foram despontando registos da mãe, sempre da mãe, da infância do menino de sua mãe - uma infância que perdura nos versos, mesmo quando o menino cresce, procura a cidade, descobre o Tejo e outra vida, também ela feita de tempo:
O tempo da leitura - Cesário, Pessoa, Negreiros, Lorca, Torga, Saramago e quantos outros por dizer...
O tempo de outrora e de agora, feito de minutos, de tardes e de noites, de dias, de ocasiões, de todas as estações... o tempo agora é o tempo do trabalho, das árvores que chilreiam - plátanos, jacarandás ou ipomeias -, de jovens sem tempo para o tempo, de colegas a quem o tempo levou ou o desenham em versos traçados...
(...)
Atrevo-me, assim, a propor ao poeta que, sempre que possível, se liberte do trabalho para que nos conceda mais um tempinho de luz...
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4.12.2014

Na Biblioteca Central da Escola Secundária de Camões, a professora Margarida Sérvulo Correia apresentou Sonhos Sobrantes. Fê-lo numa alocução sóbria, inteligente e bem fundamentada, iluminando os versos de memória do poeta António Souto.
O poeta, por seu turno, visivelmente orgulhoso, leu três belos poemas alusivos a Saramago, ao Natal e a Abril, e agradeceu, revelando os laços passados e presentes.
A Biblioteca estava cheia, sobretudo de alunos que tudo ouviram em silêncio, sem que, no entanto, tenham tido oportunidade de tomar a palavra...
A Margarida Souto (?) ficou sentada  à minha frente e tudo escutou. O que terá pensado? 

13.10.14

Não cantarei


Nenhum que use de seu poder bastante
Pera servir a seu desejo feio,
E que, por comprazer ao vulgo errante,
Se muda em mais figuras que Proteio.
Nem, Camenas, também cuideis que cante
Quem, com hábito honesto e grave, veio,
Por contentar o Rei, no ofício novo,
A despir e roubar o pobre povo!

Camões, Os Lusíadas, Canto VII, estância 85.


(Há, pelo menos, três ou quatro membros do Governo da Lusitânia a quem estes versos colam na perfeição!)

Consta que o Governo esteve reunido durante 18 horas para aprovar o OGE 2015. Nos mujimbos que circulam, não dou conta de que da Ordem de Trabalhos constassem duas leituras prévias: A Constituição da República Portuguesa e as reflexões do Poeta n' OS LUSÍADAS.

Perante esta lacuna, estou sem saber qual é o papel do Doutor Nuno Crato no Conselho de Ministros...

12.10.14

A morte de Sylvia

«Rupert e Frances desceram e entraram na sala onde Sylvia estava, de facto, mergulhada num sono de morte: estava morta.» Doris Lessing, O Sonho mais Doce, página 425, editorial Presença.

Num romance em que o SONHO vermelho vai construindo um espaço que só não é absurdo porque, ao alastrar, gera um conjunto de monstros iluminados que, em nome de ESTALINE, se propõem libertar os povos e, no entanto, os deixam morrer à míngua de água, de saúde, de ilustração, de paz... surge a doce e frágil Sylvia que mergulha no africano terreno saqueado e abandonado para libertar aquele povo da doença e da ignorância.
Sylvia tudo faz, tudo sofre, sem apoio dos libertadores, novos colonizadores, embora menos vermelhos, mais gordos e, sobretudo, mais ricos. Mais dependentes do Capital Global!
Sylvia, voluntária, cooperante, representa todos os que se entregam a uma Causa sem esperar mercês. 
Confesso que a morte de Sylvia me choca porque ela representa a morte de todos os que, desde a 2ª Guerra Mundial, se sacrificaram por construir um mundo mais justo e, na verdade, as desigualdades não param de aumentar. Não só a Sul mas, também, a Norte!

11.10.14

Dispersão


Cada vida deveria ter um rumo, mesmo se de médio prazo. No entanto, nos tempos que correm, ninguém se contenta com essa singularidade. Acredita-se que se pode ter vários rumos sem cair na dispersão...
De facto, essa dispersão é uma constante dos nossos dias, provocando desperdício e insucesso académico, profissional, familiar e pessoal. 
Estamos cada vez mais pobres!
Literariamente, a dispersão foi acantonada no modernismo. Creio, contudo, que a dispersão é filha do individualismo, em particular, do romântico.
Entrámos recentemente na Idade Global, mas ainda estamos longe de definir um rumo e de mantê-lo.

10.10.14

O Governo prefere bater em latas...



Governo diz que não há razão para alarme social por causa do Ébola.

Em vez de explicar o risco, de detalhar os cuidados a ter em caso de ida ou de regresso das zonas mais afetadas, de anunciar as medidas tomadas para evitar a contaminação do pessoal médico e dos cidadãos, o Governo prefere bater em latas... À informação, o Governo prefere a propaganda!
A experiência diz que devemos estar atentos aos desmentidos e às promessas governamentais. Sempre que promete, não cumpre! Sempre que desmente, é porque o risco está iminente...
(...)
Há, no entanto, exceções. O primeiro-ministro prometeu que os ministros da educação e da justiça estavam longe de regressar a casa e, de facto, eles mantêm-se nos seus postos. 

9.10.14

António Lobo Antunes desespera

O NOBEL da Literatura 2014 foi atribuído a Patrick Modiano

Protégé de Raymond Queneau, Patrick Modiano a publié son premier roman, la Place de l’Etoile, en 1968. Il a depuis écrit une trentaine de romans, tous publiés chez Gallimard. En 1974, il a écrit, avec le cinéaste Louis Malle, le scénario d’un film à succès, Lacombe Lucien, l’histoire d’un adolescent tenté par l’héroïsme, et qui plonge dans la collaboration dans la France de 1944. Il est également l’auteur d’autres scénarios, ainsi que d’un essai avec Catherine Deneuve sur la sœur tôt disparue de l’actrice, François Dorléac.
Juré en 2000 du Festival de Cannes, il a aussi écrit des paroles de chansons, comme Etonnez-moi Benoît !, interprétée par Françoise Hardy, et publié un entretien avec l’essayiste Emmanuel Berl (Interrogatoire).
Il obtient en 1972 le Grand Prix du roman de l’Académie française pour les Boulevards de ceinture, le Goncourt en 1978 avec Rue des boutiques obscures et le Grand Prix national des lettres pour l’ensemble de son œuvre en 1996. Patrick Modiano est traduit en quelque 36 langues, dont en suédois dans la maison d’édition d’Elisabeth Grate, qui publie également les œuvres de Jean-Marie Le Clézio, dernier prix Nobel de littérature français, consacré en 2008.
Patrick Modiano succède à la nouvelliste canadienne anglophone Alice Munro, primée en 2013, et emporte la récompense de huit millions de couronnes (environ 878 000 euros). Son nom figurait parmi les favoris au prix depuis de nombreuses années. Il recevra son prix à Stockholm le 10 décembre.
http://www.liberation.fr/livres/2014/10/09/le-francais-patrick-modiano-prix-nobel-de-litterature_1118123
Ao contrário de António Lobo Antunes, a escrita de Modiano é simples, concisa e elegante. Ao leitor exige-se leveza ...

8.10.14

Dá sempre jeito... a ciência política


Vaticinei há uns tempos que «o homem podia ser seguro mas não teria futuro». Como me enganei! Afinal, o homem deixou a política ativa para dedicar-se ao ensino de 'ciência política' na UAL.
Contra mim me falo: "Quem não sabe fazer, ensina!"
Ele tem, em relação a mim, uma vantagem, apesar de ter gasto três anos a descobrir a falta de jeito para a ação política: aprendeu com o erro. Por isso, agora vai fazer o que melhor sabe: catequizar. Pelo contrário, eu há quarenta anos que ensino e ainda não descobri se terei jeito para a ação política... nem para o ensino!
(...)

Desconfio, no entanto, que este tirocínio docente na UAL, certamente como professor auxiliar, não passa de uma pausa, à espera do falhanço do Usurpador.
Em tempos idos, conheci várias personalidades de distintos quadrantes políticos que viviam um período de pousio na UAL. Não lhes reconhecendo particulares competências científicas e, sobretudo, pedagógicos, certo dia perguntei ao Magnífico Reitor a razão da sua contratação. 
O Reitor foi claro: Uma Universidade que queira sobreviver deve ter no seu corpo docente representantes de todas as tendências partidárias, da extrema-direita à extrema-esquerda. Dá sempre jeito!