25.12.15

O serralho e as serralhas

Na definição de Nuno Júdice, «o serralho é um espaço governado por eunucos dirigidos pelo tirano Solim...» prefácio de Cartas Persas, de Montesquieu.

Não tenho qualquer motivo para pôr em causa a definição, todavia não posso deixar de confessar que muito antes de pensar em qualquer tipo de harém, já conhecia o serralho do meu avô materno, e lá nunca avistei qualquer concubina.
O serralho era, afinal, um pequeno quintal pedregoso, onde se podia fazer uma pequena horta e, sobretudo, pôr a secar figos e uvas na eira que, por vezes, também protagonizava uma ou outra descamisada ou esfolhada. No serralho havia, sim, um alpendre que não precisava de ser vigiado, pois o meu avô materno andava longe de ser o tirano Solim...
Poder-se-ia pensar que as esposas do Sultão fossem  as serralhas, mas no caso, estas não passavam de leitarugas que, sempre que penso nelas, continuam a incomodar-me. Com frequência, a minha mãe ordenava-me que fosse apanhar serralhas para alimentar os coelhos e era aí que o problema surgia: não só era difícil arrancá-las da terra, como me deixavam as mãos encardidas de um líquido branco que se lhes colava irremediavelmente...
E mais não acrescento para não ficar mal na prosa de infância!

24.12.15

FELIZ NATAL!

CARUMA deseja um FELIZ NATAL a todos os seus leitores e, também, àqueles que a espaços a espreitam a verificar se ainda não se transformou em cinza.

CARUMA não ignora que é preciso paciência para lhe aturar a mania de espetar agulhas em quem se põe a jeito e de insistir em ideias que se afastam cada vez mais dos valores dominantes. Na verdade, cheguei a pensar em desejar um SANTO NATAL, mas desisti ao verificar  que os santos atuais são bem diferentes dos de outrora...

23.12.15

É Natal!

«Os trabalhadores da CP e os seus familiares voltam a viajar gratuitamente nos comboios da empresa a partir de 01 de janeiro, segundo deliberação do Conselho de Administração, repondo um direito suspenso há três anos.
A CP – Comboios de Portugal decidiu repor o direito de os trabalhadores no ativo, cônjuges e filhos em idade escolar (até 25 anos), bem como dos trabalhadores reformados, a um regime de concessões de viagem, isto é, acesso gratuito às viagens em comboios da empresa.
»

Por este andar, o ensino acabará por ser gratuito, tal como a saúde. Os familiares dos empregados dos supermercados passarão a abastecer-se de borla... As famílias dos banqueiros e dos bancários terão direito a crédito ilimitado...

Eu, por mim, espero que o Pai Natal me liberte dos 29,5 % de penalização, apesar dos 41 anos completos de carreira contributiva.
No entanto, não devo ter sorte, pois nunca fui ferroviário, nem pertenci a qualquer conselho de administração, nem integrei nenhum grupo parlamentar...

22.12.15

Na barbearia com Lídia Frade

Com este frio, decidi cortar o cabelo. Quem me atendeu foi a senhora Lídia Frade, a contas com uma tendinite que lhe limita o movimento de braços tão necessários à tarefa.
Nos últimos meses, a senhora já tinha partido um pé, o que, como se compreende, não a terá ajudado no negócio.
Enquanto me desbastava a trunfa, íamos trocando opiniões sobre o sistema de saúde, pois, infelizmente, temos algum conhecimento das limitações do SNS. Por exemplo, a dona Lídia necessita de fisioterapia, mas vê-se obrigada a pagá-la do seu bolso, pois o SNS só lhe disponibiliza o serviço no Hospital Curry Cabral, com a consequente perda de tempo e custo acrescido resultante de deslocação de táxi... 
Terminada a tarefa, paguei por uma tabela que eu próprio determino. E nesse momento, a senhora Lídia ofereceu-me um SEU livro de poemas com a seguinte dedicatória:

Sr Manuel Gomes,
A vida é complemento e história de vidas
A autora,
Lídia Frade

Do livro Amor Eterno / Interregno e Silêncio
Zaina editores, 2010

                                     transcrevo o poema FOGO

Que arde, percorre, consome
Passando da abundância à fome.

Ficando sem norte
Destrói sentidos, perdidos,
Consome a vida, deixando a morte.

Fúria incandescente,
Engole viva, a semente
Que deixa estéril o presente.

Por onde passa, arrasa
Que voa sem asa
Galopa sem rédea
E deixa sem casa.

É no fogo afinal,
Que está a cor de desejo
O tilintar do vil metal
E cinza de sonhos
E o sadismo do mal.

                                                   (Afinal, os barbeiros sempre amaram a poesia ou será impressão minha? Relembro Domingos Reis Quita, António Variações...)

21.12.15

O pai natal traz-nos um novo cambalacho

O contribuinte não tem direito a atualização do salário ou da pensão, no entanto é obrigado a pagar os cambalachos entre os políticos e os banqueiros.
Agora, o cambalacho chama-se BANIF! Ao longo dos anos,   banqueiros e políticos encobriram-se uns aos outros, e quem vai pagar é o contribuinte - em 2015, 2016, 2017...

Entretanto, que eu saiba, ninguém foi preso. Banqueiros e políticos vão encontrar-se numa nova comissão de inquérito parlamentar, em vez de serem apresentados a um juiz...

E o contribuinte, resignado, parece considerar que tudo corre sobre rodas, indo celebrar o Natal "acima das suas possibilidades", pois os banqueiros anunciaram que pode gastar agora e começar a pagar em março de 2016, com juros, claro...

Bom Natal! E não se esqueçam dos milhares de milhões que estamos obrigados a pagar...

20.12.15

O pai natal

Por estes dias, o que me apetece é uma choupana bem longe de qualquer pai natal e da azáfama que ele supostamente traz consigo.
Supostamente, porque o próprio pai natal é uma produção da má-consciência que rege as relações humanas.
Os presentes da quadra não fazem esquecer a pobreza em que milhões vivem  por culpa da plutocracia crapulosa que todos os dias está cada vez mais rica.
De facto, se o pai natal é produto da má-consciência,ele não deixa de ser uma forma poderosa de alimentar os plutocratas... que, encerrada a quadra, acabam a confessar que o natal já não é o que era... embora não se estejam a referir ao nascimento do menino Jesus...

19.12.15

O Chiado de hoje

Ir ao Largo de Camões na quadra natalícia é um pesadelo. Primeiramente, porque é quase impossível estacionar, e isto sem falar no custo do estacionamento. Depois, porque parece que o mundo desabou entre o Largo do Chiado e o Rossio. A Rua Garrett  faz lembrar o Tejo em dia de cheia, neste caso, humana: - um rebanho desce e outro sobe, tirando fotos a tudo o que se move ou reluz; são milhares de fotos por hora partilhadas no instante.
O Chiado de hoje é exótico nas línguas e nas roupas, sem esquecer a diversidade de "atuações" que decorrem um pouco por toda a parte, na procura de uma recompensa imediata que garanta a sobrevivência diária - ricos e pobres, idosos e jovens misturam-se, acotovelam-se em tangentes de equilíbrio precário.
Do comércio nem vale a pena falar, pois não sei se vende, a verdade, no entanto, é que as lojas ( as boutiques) se encontram repletas de mirones...
Também a Basílica dos Mártires estava repleta de ouvidos atentos ao concerto que ia decorrendo ou seria uma animada celebração litúrgica? Entrei e, por momentos, senti-me lá bem...