23.1.19

Filhos de um deus deposto

Obter a chave ou as chaves para poder interpretar os textos, tomados como redes semânticas autónomas, como visões do mundo particulares, poderia ser motivo suficiente para entrar na sala de aula…
Na verdade, eras houve em que assim foi. O aluno entrava na sala de aula sequioso de aprender, disponível para acolher as noções, os conceitos que davam corpo à cultura. Ser culto pressupunha a capacidade de abordar os signos nos respetivos contextos, seguir-lhes o diálogo por vezes sem saída e mesmo assim respeitá-los…
Hoje, com a morte do contexto, com o esvaziamento da situação, de tão frágeis os signos perderam todo o fulgor que iluminava os passos dos discentes…
Hoje a simples alusão a Deus num contexto verbal específico, à Vontade divina numa visão do mundo poética, é suficiente para libertar os demónios desafiadores de qualquer padrão de cultura.

22.1.19

António Gedeão, um poeta menor?

Agora, conheço alguns poetas atuais, com quem falo e de quem sou amiga, que me dizem que ele é considerado no meio como um poeta menor. Um retrato de António Gedeão

Cristina Carvalho, filha de António Gedeão, diz que já viu a frase ‘O sonho comanda a vida’ nas situações mais insólitas, o que prova a popularidade do poema Pedra Filosofal. Mas acha que essa popularidade suscitou a desconfiança do meio literário. José Cabrita Saraiva, Sol.

Uma entrevista esclarecedora sobre o homem  Rómulo de Carvalho… e indiretamente sobre a pobreza inteletual das comadres e dos compadres que assaltaram a academia e a comunicação social.

20.1.19

A ser iconoclasta ou talvez não


Inundado de imagens, atrofio. Observo a encenação e não encontro a rede… provavelmente, o estigmatismo turva-me a verdade. 
Por alguma razão há quem condene a iconofilia.
Já não sei o que pensar!

19.1.19

Uma ideia farpada

Serpa
Pouco importa se não recordo a hora, agora já difusa a lembrança de que não há nada mais abjeto do que os poderes dos lugares pequenos, ou só das pequenas pessoas do lugar, pressinto que devo evitar pronunciar-me sobre a celebração dos estrangeirados que cruzam os céus pátrios sempre amargurados em versos, crónicas, ensaios e contos de andanças… 
Fico a pensar na razão do desencanto e da diatribe demoníaca, e surge-me a ideia do arame que só incomoda se for farpado, uma ideia farpada - adjetivo inapropriado se os dias não forem baços. 
Baços porque as pessoas dos lugares pequenos nunca perceberam que os estrangeirados o são por causa delas…

18.1.19

Rabiscos

«Estas páginas são rabiscos da minha inconsciência inteletual de mim.» Bernardo Soares

não são uvas, são rabiscos 
(se fossem uvas, seriam dona maria…)
… vivo do rabisco da fartura alheia 
melhor seria que estas páginas fossem riscos… de joan miró

17.1.19

Um lugar estranho

Museu do Oriente
A bondade era coisa preciosa - adivinhava-se no olhar de um avô, de uma tia - refrigério de horas tardias, gastas entre varapaus e cobras arreliadoras sob a batuta de demónios esganiçados perseguidos por tachos e panelas, suspensos da gritaria suada da terra estéril…
Tudo era herança de ter nascido num lugar amaldiçoado ou, pelo contrário, tudo era apelo à superação. E, por mais surpreendente que hoje tal possa parecer, a única porta que abria os céus era a da escola… 
A minha infância foi um lugar estranho donde saí para outra vida.