24.7.15

Farto de propaganda

Tudo é propaganda: a política é propaganda; a propaganda é política. E quem pensa assim é a ministra das Finanças, o que me permite acrescentar que o ministério das Finanças mais não é do que o ministério da propaganda...

Farto da propaganda deste dia, acabo de visitar a Fonte Luminosa, lugar multicultural, se atentarmos no parque infantil, nos bancos de jardim, nas jogatanas de bola e nas esplanadas... Lugar que poderia ser de memória, mas do quê? Quem sabe?

Acabei por percorrer a rua Guerra Junqueiro, centro comercial em hora de fecho e, de súbito, vi que a Mexicana parece que passou à história. Será verdade?

E claro, juntando as pontas, concluo com um conselho do esquecido autor d' A Velhice do Padre Eterno

Arranja um casamento e aprende a ter juízo.
A noiva pouco importa; o dote é o que é preciso
Discuti-lo. Olha lá, os pais que sejam velhos!...
Que vá para o diabo o reino da Utopia!
E hão de te nomear sócio da academia
E, quem sabe! talvez barão dos Evangelhos.

              in A Semana Santa.

Um conselho que eu desprezei, como se comprova pela minha atual situação. Eu que casei há mais de 40 anos na rua Guerra Junqueiro!

23.7.15

Sensações

O poema é de Arthur Rimbaud e exprime bem como ando desajustado. Ainda não há muito tempo tive a possibilidade de, nos fins-de-tarde azuis do verão, ir pelos atalhos observar os campos de trigo e calcar o restolho... e sonhar e sentir a frescura dos riachos e deixar que o vento banhasse os meus cabelos...
Agora que tenho mais tempo e menos meios, leio com vagar as sensações dos poetas franceses da segunda metade do século XIX e mergulho no amarelo das notícias literárias dos anos 90 do século XX...
(...)
O resto serão areias de uma ilha, um pouco ao sul e, talvez, com aves de arribação... Prometo, no entanto, que pouco falarei, embora continue a pensar, não no amor infinito nem na boémia, mas nas sensações até que elas se esfumem na Natureza.

Par les soirs bleus d'été, j'irais dans les sentiers,
Picoté par les blés, fouler l'herbe menue:
Rêveur, j'en sentirai la fraîcheur à mes pieds
Je laisserai le vent baigner ma tête nue.

Je ne parlerai pas, je ne penserai rien:
Mais l'amour infini me montera dans l'âme,
Et j'irai loin, bien loin, comme un bohémien,
Par la Nature, - heureux comme avec une femme.

      (Mars 1870) 

22.7.15

Sob a cortina flutuante

«Or les petits enfants, sous le rideau flottant / Parlent bas comme on fait dans une nuit obscure./ Rimbaud, Les Étrennes des Orphelins.

Onde é que esse tempo já vai!? Por mais que os dias sejam obscuros, as vozes elevam-se cada vez mais alto numa algaraviada inútil.
Acabo de saber que o Parlamento entrou de férias, breve sobressalto de acalmia... Só que o Presidente prepara-se para anunciar a data das próximas eleições legislativas - a expectativa de diminuição da infernal propaganda afunda-se definitivamente.

E eu que sempre amei o silêncio, vejo-me enredado na vertigem ruidosa que se eleva lá fora e, sobretudo, cá dentro... dentro de mim...

21.7.15

Continuo a juntar dados

Continuo a juntar dados do tempo em que parecia haver a intenção de criar uma comunidade lusófona liberta de preconceitos. Uma comunidade capaz de sarar as feridas do tempo da colonização e que, em simultâneo, se transformasse numa plataforma cultural e económica, pronta a libertar os seus membros de dependências demasiado asfixiantes...

A ideia tem vindo a definhar, antes de mais porque a opção portuguesa de integrar a União Europeia e, sobretudo, o euro, inviabiliza a prioridade lusófona. Portugal é hoje uma província periférica de um projeto alternativo daqueles que se apressaram a entregar as colónias aos grandes blocos políticos dos anos 70.

Esta persistência, na verdade, já não interessa a ninguém!

20.7.15

Afinal

Primeiro, plantam-se as árvores; depois, deixam-se secar...
Primeiro, enchem-se os lagos; depois, secos, ficam ao abandono... Parecem saídos de uma qualquer escavação arqueológica, entretanto, abandonada a céu aberto...

A educação é prioridade! Sem ela não há sucesso! Depois, valoriza-se o dinheiro fácil...O futuro é da juventude! Depois mostra-se-lhe a porta de saída...

Os credores amigos salvaram-nos da bancarrota! Quatro anos depois, a dívida aumentou cerca de 60.000 milhões de euros...

Afinal, se tivéssemos regado a floresta e os jardins, se não tivéssemos substituído os lagos pelas piscinas, se tivéssemos valorizado a inteligência e o trabalho, hoje, seríamos mais felizes e... menos pobres.

19.7.15

Degradação no Jardim da Quinta das Conchas e dos Lilases

«Possuidora de uma área de mata profusamente arborizada (cerca de dois terços da superfície total), a Quinta das Conchas encontra-se favorecida por diversas áreas de lazer, nomeadamente, um café/auditório, restaurante, parque infantil, parque de merendas, lago com pontão, bem como um circuito interno que permite a prática de actividades desportivas, como por exemplo, caminhada, corrida e/ou ciclismo. A norte do jardim, a Quinta dos Lilases complementa o espaço, sendo constituída por uma mansão de estilo colonial (a qual serviu de residência a Francisco Mantero), jardim e lago - com duas ilhas arborizadas ao centro.
Tendo sido alvo de obras de beneficiação e requalificação, o Jardim da Quinta das Conchas e dos Lilases foi "reinaugurado" ao público a 12 de Maio de 2005, sob a tutela do presidente da edilidade lisboeta à data, Pedro Santana Lopes. A secção de terreno que constitui a Quinta dos Lilases foi, por sua vez, reaberta ao público a 15 de Janeiro de 2007, presidindo António Carmona Rodrigues à Câmara Municipal de Lisboa à data.» 
Hoje, dia 19 de Julho de 2015, o Lago tropical encontra-se num estado que nem as pombas devem compreender. Porquê? Com tantos turistas na cidade de Lisboa, será assim tão difícil encontrar uma verba que reponha o projeto inicial e mate a sede às pombas?

18.7.15

Um classificador que nunca leu Rimbaud

O helicóptero interrompe-me o sono leve e, durante uma hora, afasta-se e regressa, sobrevoando o bairro: não sei se se desloca do aeroporto para o Parque das Nações ou para o Montijo. Chego a pensar que são os angolanos a desembarcar os diamantes...
Não oiço os sinos da igreja do Cristo Rei a convidar-me para as matinas! Ao alcance da mão, tenho, no entanto, Illuminations, de Rimbaud! E retomo a leitura: 

"Un Prince était vexé de ne pas s'être employé jamais qu'à la perfection des générosités vulgaires."

(Sem ser príncipe, também eu me sinto vexado por não ser capaz de ir além da generosidade vulgar. Talvez seja por esse motivo que continuo a dizer sim, quando deveria ocupar o meu tempo de forma mais construtiva.)

E assim, horas mais tarde, lá subi e desci a rua da Igreja com o Santo António alheado: Não havia por ali nem pássaros nem peixes a quem pudesse dirigir-se... E quando dali saí fiquei com a certeza de que não gosto da Padaria Portuguesa! Não há ali espaço para mim: Não é possível tomar um café ao balcão; há sempre duas filas distintas mas cujo atendimento é indistinto; e, na esplanada, as mesas estão tão próximas que pareço fazer parte duma nova família...

Finalmente, graças às virtudes da tecnologia, lá elaborei mais um parecer (gratuito) sobre a classificação  atribuída a uma prova de Português: 9,2 valores. Em três dias, já é o segundo 9,2 de que tomo conhecimento.
Quero acreditar que este classificador nunca leu Rimbaud, e que detestará a generosidade vulgar...