17.4.12

A ser verdade…

A ser verdade, de nada serve a frustração de ver tantos jovens de 15 e 16 anos a desperdiçarem tempo nas salas de aulas. Isto para não falar dos “falsos” adultos!

Na obra Sobre o Tempo (14, Zahar) Norbert Elias é taxativo:«ao crescer (…) toda a criança vai-se familiarizando com o “tempo” como símbolo de uma instituição social cujo caráter coercitivo ela experimenta desde cedo. Se, no decorrer de seus primeiros dez anos de vida, ela não aprender a desenvolver um sistema de autodisciplina conforme a essa instituição, se não aprender a se portar e a modelar a sua sensibilidade em função do tempo, ser-lhe-á muito difícil, se não impossível, desempenhar um papel de um adulto no seio dessa sociedade.»

14.4.12

Estranha forma de acordar

Esta madrugada a chuva era tão intensa que a minha mente, vá lá saber-se porquê, me martelava os versos de Camões: «Chove nela graça tanta / que dá graça à fermosura»

E ia pensando se aquela chuva ainda poderia  ressarcir esta terra dos danos que todos os dias lhe acrescentamos, enquanto Platão me acenava que aquele precipitado me poderia servir para explicar a importância dos seus arquétipos.

Ao levantar-me,  não posso deixar de pensar nesta estranha forma de acordar em que a teoria platónica entrou pela garganta de Camões dando forma a uma explicação nada ortodoxa e, de certa forma, anacrónica.

Mas que a chuva caía, caía! E sem tropeçar!

12.4.12

Este caminho…

Este caminho só tem um sentido! De nada serve olhar à direita e à esquerda, quando ficamos sós…

Atrás, na encruzilhada, ainda podíamos hesitar ou mesmo inverter a marcha…Agora, os rostos que nos fitam já não veem senão uma nódoa escura!

Os pés calcam a terra, mas o rasto esboroa-se, apesar da lama…

11.4.12

O fio…

O fio, independentemente da matéria constituinte, quando mal manejado, acaba por quebrar. (…)

O voluntarismo é mau conselheiro porque incapaz de distinguir o bem comum do bem particular. (…)

A dispersão mata o rumo. (…) O acaso mora numa rua por nomear.

Da navalha, enxergo a lâmina por afiar…e, sem mais, recuso dizer o que estou a pensar… pois não quero mais incomodar…

10.4.12

Rasquera votou… E agora?

La pregunta a la que tenían que responder los rasqueranos es "¿Estáis de acuerdo con el plan anticrisis aprobado por el Ayuntamiento de Rasquera en sesión plenaria del 29 de febrero?", y del resultado que se obtenga hoy no solo dependía la continuidad del proyecto, sino también la del propio gobierno municipal, que anunció que dimitiría en bloque si la consulta no obtenía el 75% de los votos favorables.

Rasquera (Tarragona), 10 abr.- El 56,3 por ciento de los participantes en el referendo celebrado hoy en Rasquera han votado a favor del plan anticrisis aprobado por el plenario municipal el pasado 29 de febrero y que incluye una plantación de cannabis, por lo que el alcalde medita si presentará su dimisión.

Irá o alcaide cumprir com o prometido?

8.4.12

Mais um dia…


Mais um dia sem ressurreição! A Páscoa já não é feliz, se alguma vez o foi, neste tempo de ruínas insepultas…
Amanhã, os jogos florais regressam: palavras vãs evocarão palavras perdidas; cores várias disfarçarão fendas insuportáveis…e as flores de maio desabrocharão avessas ao compadrio…

6.4.12

Queimada




A minha relação com o fogo é há 50 anos de ordem traumática. Hoje, finalmente, participei numa queimada catártica, apesar de haver certamente quem me possa acusar de contribuir para o empobrecimento dos solos e de prejudicar a biodiversidade.

4.4.12

O dragão

Do rosto da 1ª edição das obras completas de Gil Vicente (1562) para o rosto da Selecta Literária (1959), organizada por Júlio Martins e Jaime da Mota – Ensino Liceal /2º Ciclo / volume II / 4º e 5º anos _ o dragão, rosto do Livro dos Seres Imaginários de José Luis Borges, persegue- me…

Aos 15 anos, um aluno do ensino liceal conhecia muito mais autores portugueses que, hoje, um mestre de Bolonha! E não faltavam autores do século XX: Eugénio de Castro, Camilo Pessanha, D. João da Câmara, Augusto Gil, António Sardinha, Júlio Dantas, Teixeira de Pascoaes, Florbela Espanca, A. Lopes Vieira, Fernando Pessoa, Sá-Carneiro, Aquilino Ribeiro, Ferreira de Castro, José Régio, Miguel Torga, Sebastião da Gama.


De qualquer modo, parece que com a passagem do tempo tudo se simplifica: Já em 1959, alguém se tinha esquecido da Esfera Armilar e da Cruz de Cristo.
Por outro lado, parece que, no século XVI,  o dragão era emblema imperial, seguindo a lição oriental e não a ocidental…

E hoje?

31.3.12

Por onde andam os portugueses



Pena é que os governantes sejam tão pequenos!

Percorri 200 Km e não encontrei 200 portugueses. Entretanto, parece que 200.000 desciam a Avenida da Liberdade… Mais valera que tivessem optado pelo grande lago – o Alqueva!

30.3.12

Registo


Um pequeno desvio à entrada de Rosário (Alandroal), e no meio de uma moita, vislumbramos quatro ou cinco sepulturas medievais. Pelo abandono do terreno, é fácil adivinhar que outra história ali se esconde.

A presença destas sepulturas desperta em mim a ideia da voracidade tempo, fazendo-me sentir o quanto este registo é inútil.

29.3.12

Camping Rosário - Alandroal



Quando a água alaga a terra, as árvores é que sofrem! Provavelmente, o Alqueva exige uma florestação diferente da mediterrânica… Pelo menos, na zona de Rosário (Alandroal). Percebe-se o fascínio pela oliveira, mas o critério de plantação de árvores não deve ser apenas económico.


No Camping Rosário (2002-2012), Irene e Ernst Hendriksen recebem tão bem que, à chegada, oferecem um CD com um «mix de música tradicional e contemporânea Portuguesa». Não há dúvida, ainda temos muito a aprender!

/MCG

27.3.12

A “estátua sensível” de Condillac…



«Que na consciência da estátua haja um único cheiro e teremos a atenção; que perdure um cheiro quando cessou o estímulo e teremos a memória; que uma impressão atual e outra do passado ocupem a atenção da estátua e teremos a comparação; que a estátua perceba analogias e diferenças e teremos o juízo; que a comparação e o juízo ocorram de novo e teremos a reflexão; que uma recordação agradável seja mais viva do que uma impressão desagradável e teremos a imaginação.» Jorge Luis Borges, Dois Animais Metafísicos, O Livro dos Seres Imaginários.

A rainha que trocou o pão (as moedas) por rosas já antes de ser estátua era sensível! E a ideia da troca só pode ter surgido porque já experimentara o desagrado do seu senhor, o que me leva a concluir que uma dor também pode desencadear a imaginação de um povo…

/MCG

25.3.12

As cores do tempo…




A maior dificuldade do filósofo é definir o tempo. As palavras perdem o sentido, cristalizam e o tempo flui, avesso ao discurso verbal.
No entanto, por instantes, o tempo deixa-se ficar na cor do telha, da madeira, do ferro, da pedra, da ideia republicana, do olhar embevecido – em árvores outonais do príncipe real.

24.3.12

Oiço…


Oiço, como se o cheiro / De flores me acordasse…/ É música – um canteiro / De influência e disfarce. Fernando Pessoa

 

Explicam-me os alunos que os testes não correram bem, mas que sabem quanto valem, que, afinal, considerando o objetivo, a nota que lhes atribuo é injusta. E devem ter razão!

A ameixeira  floresce, indiferente à seca, e não se queixa se a não escoro. O poeta verseja, ciente de que no mundo tudo é «influência e disfarce». 

Afinal, que resposta devo dar a estas ‘almas’ injustiçadas? Ou devo considerar que  há exigências que não merecem resposta?

Já agora concluo a citação:

Impalpável lembrança, / Sorriso de ninguém, /Com aquela esperança / Que nem esperança tem… // Que importa, se sentir/ É não se conhecer? / Oiço, e sinto sorrir/ O que em mim nada quer.

22.3.12

Um profissional aplicado!

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Habitualmente, não comento a ação das forças da ordem. Nesta situação, porém, não posso deixar de salientar a amplitude e a virilidade do movimento. Acossado e perseguidor revelam saber bem o que querem.

E ainda há quem nos acuse de abulia!

“Ilustramos recortes da nossa história”


António Vieira, José Rodrigues Miguéis e Rómulo de Carvalho nasceram todos no mesmo bairro, à sombra de Santo António! 
No entanto, olhando mais de perto, é possível enxergar um intruso. Quem será?

18.3.12

Chamados a capítulo


«Estas são as justiças visíveis.» José Saramago, Memorial do Convento, cap. XVI.
Com este curto período, o narrador resume o parágrafo anterior, aquele em que, intertextualmente, mergulhara no sermão do Padre António Vieira para expor que no século em curso ( da história e do discurso) o dinheiro é a causa maior da injustiça visível.
«Das invisíveis, o menos que se poderia dizer é que são cegas e desastradas, como ficou definitivamente demonstrado naufragando o barco em que vinham de caçar na outra banda do Tejo o infante D. Francisco e o infante D. Miguel, ambos manos de el-rei, deu-lhes uma rajada de vento sem avisar e virou-lhes a vela, caso foi ele que morreu afogado D. Miguel e se salvou D. Francisco, quando honrada justiça seria o contrário, conhecidas como são as maldades deste, desencaminhar a rainha, cobiçar o trono d’el-rei, dar tiros em marinheiros, ao passo que do outro não constam, ou são de somenos. Porém, não devemos julgar com leviandade, quem sabe se não pagou D. Miguel com a vida ter andado a cornear o mestre da barca ou a enganar-lhe a filha, a história das famílias reais está cheia destas ações.» José Saramago, Memorial do Convento, cap. XVI.
De anáfora em catáfora, a ordem dos termos inverte-se como se na família real todos merecessem o mesmo castigo, pois os crimes públicos e privados equivalem-se. Em termos de técnica narrativa, o modo como Saramago utiliza a vírgula serve para, de uma pincelada, resumir o que a História  branqueara, mas que a Literatura registara e, em particular, para nivelar os atos da família real. O próprio léxico, ao alternar o registo literário e técnico com o calão, mostra que aquelas altezas eram postiças.
Em conclusão, este narrador para nos iniciar na outra História, necessita de narrar, descrever, comentar e, principalmente, resumir, recapitular… chamar-nos a capítulo, como se fossemos cónegos ou rosa-cruzes.

16.3.12

Pecados capitais

( As ideologias, os temas, o discurso; a paródia, a carnavalização, a intertextualidade… )

Na capital do reino (ou da república), a gula de uns tantos devora os restantes:  «é uma boca que mastiga de sobejo para um lado e de escasso para o outro, não havendo portanto mediano termo entre a papada pletórica e o pescoço engelhado». (Implícitas fluem a ideologia e a retórica do Sentimento dum Ocidental de Cesário Verde.)

«Porém, a Quaresma, como o sol, quando nasce, é para todos.» (José Saramago, Memorial do Convento, cap. III)

Quando se esperava que a abstinência fosse respeitada por ricos e pobres, o narrador descreve-nos uma «procissão de penitência» que, em vez de  redimir dos excessos do Entrudo, escancara a lascívia dos penitentes em poses sado-masoquistas prometedoras de futuras orgias com as histéricas espectadoras de janela e varandim – «que Deus não tem nada que ver com isto, é tudo coisa de fornicação».

A «procissão de penitência» não cumpre os ditames de Deus e da Igreja, e o tempo é de hipocrisia e de mentira: senhoras e criadas, cúmplices na satisfação da carne adúltera, enxameiam igrejas, confessionários e lugares escusos, deixando «em casa uns tantos maridos cucos», destino a que nem D. João V terá escapado: «D. Maria Ana, como razões acrescentadas de recato, tem a mais maníaca devoção com que foi educada na Áustria, e a cumplicidade que deu ao artifício franciscano, assim mostrando ou dando a entender que a criança é tão filha do rei de Portugal como do próprio Deus, a troco de um convento.»

Perante a mentira colossal que corrói a realeza, a igreja e o próprio povo, o narrador termina o discurso, revoltado, não contra Deus, mas contra os homens: «talvez se nos calássemos todos». E entre estes homens, estamos nós em qualquer século em que sejamos…

15.3.12

O aeróstato e o ponto de vista

Na verdade, o padre Bartolomeu Lourenço inventou o aeróstato, apresentando-o com sucesso, e para estupefação da corte de D. João V, no dia 8 de Agosto de 1709. E essa novidade foi decisiva não só para o desenvolvimento da aeronáutica mas, sobretudo, para a deslocação do ponto de vista na narrativa. ( Seria interessante, analisar o modo como a ciência e a tecnologia servem o projeto de escrita de José Saramago.)

Basta ver como Saramago, consciente do contributo daquele invento, nos faz viajar sobre Portugal no Memorial do Convento, capítulo XIX: «Muito melhor veríamos, e muito mais, se olhássemos de alto, por exemplo, pairando na máquina voadora sobre este lugar de Mafra (…) não há melhor miradouro que este onde estamos, não faríamos ideia da grandeza da obra se o padre Bartolomeu Lourenço não tivesse inventado a passarola». ( E toda a panorâmica aérea nos é dada, como se fosse um grande plano, num único período.)

No essencial, Saramago, ao deslocar da terra para o espaço aéreo o ponto de vista, constrói uma representação da excentricidade e megalomania reais a que o homem coevo da edificação do convento não teve acesso, o que sobrepõe de forma magistral o plano do discurso ao plano da história.

A leitura desta obra pressupõe, assim, o desenvolvimento da competência de análise da ideologia do narrador que, a cada passo, parodia a História oficial, seja do século XVIII seja do século XX.

PS: Se aqui registo estas palavras é porque considero que, nas nossas escolas,  a leitura  da obra de Saramago está a ser vítima de uma enorme mistificação que acabará por condenar o autor ao esquecimento. É só uma questão de tempo. Veja-se por onde andam Ferreira de Castro, Aquilino Ribeiro, Miguel Torga, Agustina Bessa Luís…

14.3.12

A Torre do Prior do Ameal (de António Nobre)

Literariamente, esta torre é conhecida por Torre d’Anto porque aqui viveu, durante uma semana, no outono de 1890, o «ermitão da Saudade» – António Nobre – que, chegado a Paris, se metamorfoseou no «pobre lusíada, coitado.»

A Torre alberga atualmente a Casa do Artesanato ou Núcleo Museológico da Memória da Escrita de Coimbra.

11.3.12

Alguma cor…


Em tempo de depressão, de seca e de irracionalidade política, este fim de semana, encontrei alguma cor em Coimbra. E também descobri uma scut – a A19 – sem vivalma! ( 2 pórticos: 1,15 €)

10.3.12

Se Pedro e Inês…


Se Pedro e Inês voltassem à Quinta das Lágrimas talvez jogassem golf, deitando por terra o mito inesiano.
Terra de dor não tivesse ela pertencido à Rainha Santa Isabel, assistiu ao fulgor e ao terror de Inês, mas parece ter esquecido o sofrimento do Poeta que a eternizou.
Não  tivesse Ele, ali,  suportado a vingança de um marido e pai ciumento, e dificilmente teria escrito «Estavas linda Inês posta em sossego…»
Por isso mais do que o Lírico, é o Épico que por si chora nas páginas de Os Lusíadas e, deste modo, se vinga dos poderosos deste mundo.
E assim se compreende que lhe tenham saqueado a biografia…
PS: Entrar nos Jardins da Quinta das Lágrimas tem um preço: 2 €.

8.3.12

Algures no infinito…


Entre 1955 e 1973, Jorge Luís Borges foi diretor da Biblioteca Publica de Buenos Aires, situada durante um certo tempo na calle México. E foi lá que ele “perdeu” “El Libro de Arena” cuja posse se revelara um pesadelo, pois «el mejor lugar para ocultar una hoja es un bosque».
A estória  do livro sem princípio nem fim (como se de areia se tratasse) acompanha-me enquanto, finalmente, cumpro o habitual circuito pedestre. Só que  o infinito surge-me como uma ideia doce. O que me pesa é o finito! Nem a possibilidade de estar à deriva me agita. Pensar em Deus tranquiliza, porque estou certo que ele, ao encontrar-se algures no infinito, não está preocupado comigo… Eu não passo de uma folha perdida no bosque!
Tudo o que é finito me assusta. Se tenho que classificar 25 provas, entro em depressão: o número limitado de perguntas sufoca-me; o número previsível de erros assusta-me. Vou ter que acabar a tarefa, sabendo que, amanhã, continuo refém.
De certo modo, estou a aprender que mais valia que a dívida portuguesa fosse infinita. Passos Coelho, ao convencer-nos que as folhas do livro da dívida  são quantificáveis, deixa-nos à míngua e torna-nos cativos de nós próprios…
Afinal, Sócrates sabia do que falava. Provavelmente, algum assessor tinha lido El Libro de Arena de Borges e, em particular, a estória Utopia de un hombre que esta cansado.

6.3.12

Ao Sol!

Prédios de doze andares, em espinha, e, no intervalo, uma nesga de Tejo azul. Para lá do rio, a terra acastanhada sob um céu cerúleo, mas acastelado de falsas promessas de chuva.

Os automóveis e os camiões, alheados, continuam a rolar, longe dos profetas da desgraça… e o rumor da ponte por amortizar ensurdece-me o olhar.

Claro que, talvez, pudesse referir-me ao Álvaro e ao Gaspar – à Economia e às Finanças –, mas ainda estou longe de perceber se prefiro a familiaridade do primeiro se a nobreza do segundo. É que, para mim, quase tudo se esgota nas formas de tratamento!

Por isso vou continuar a fitar o Sol antes que ele se apague, ou, melhor, antes que os meus olhos se despeçam da língua de água que espreita por entre as torres que me cercam.

4.3.12

Quási…

«Um pouco mais de sol – e fora brasa, / um pouco mais de azul – e fora além.», Mário de Sá-Carneiro

Um pouco mais… e não teria gasto o fim de semana a classificar ‘testes intermédios’!

- Afinal, o que é que me faltou? O golpe d’asa?

- Não, o rio, porque esse com mais ou menos azul continua perto, sem, no entanto, me levar ao mar…

(Ainda a ilusão de poder ser útil!)

3.3.12

Por aqui, tudo na mesma!

A dívida continua a crescer (e o peixe recusa-se a morrer!). Não há emprego e os velhos insistem em falecer.

Há quem diga que a culpa é da gripe e do frio! O argumento até parece adequado, mas não cola…

Quebrado o aquário até o peixe morre. A culpa é do bonequeiro que é cego e prosélito informático.

De posse da tramoia, o invisível bonequeiro maneja-nos como bonifrates descartáveis.

O resto é mistificação!

1.3.12

A cor da chuva…


Se a cor identifica e agrega, se a cor interdita ou autoriza, no caso da chuva, a cinza, que a acompanha, alegra.
Agora, sim, a cor é de cinza, com ou sem Quaresma!

27.2.12

Comentar…

Não sei se vale a pena responder a comentários, sejam apreciativos ou depreciativos. Em geral, um comentário serve para explicitar a substância e não para enfatizar o acessório.

Na foto desaparecida, nós vemos a flor da amendoeira que, certamente, procuraremos adjetivar. No entanto, à volta das corolas, atarefam-se as abelhas…

… e claro, na colmeia há sempre um zângão!

25.2.12

O caminho da água

Eram dois os caminhos, mas o da ponte era o preferido. A clausura da estrutura assustava-me menos que a espessura da muralha escalabitana. Durante duas horas, a carreira percorria pachorrentamente os campos alagados – os da Páscoa chegavam a ser deslumbrantes! O Tejo desmedido embalava-me na ida e no regresso. Durante três meses, sonhava com aquele caminho – o caminho da água.

Hoje, voltei a atravessar a ponte, mas do Tejo só vislumbrei bancos de areia, e senti-me mais só do que naqueles meses em que, outrora, vivia cercado pelas muralhas fernandinas.

/MCG

23.2.12

«Numa rua perto (…) Não correu mais sangue.»



«(…) esperou que Baltasar terminasse para se servir da colher dele, era como se calada estivesse respondendo a outra pergunta, Aceitas para a tua boca a colher de que se serviu a boca deste homem, fazendo seu o que era teu, agora tornando a ser teu o que foi dele, e tantas vezes que se perca o sentido do teu e do meu, e como Blimunda já tinha dito que sim antes de perguntada, Então declaro-vos casados.» José Saramago, Memorial do Convento, pág. 56, 16ª edição

22.2.12

Um tempo pobre…

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Ao lado, um casebre em degradação no casco da vila. Por detrás, as muralhas, parte delas, em ruínas…

O arco, abandonado à sorte da natureza, esconde-se, envergonhado da nossa inépcia.

É essa inépcia que explica o nosso cativeiro!

20.2.12

São mil os passos perdidos…


«Al fin y al cabo, al recordarse, no hay persona que no se encuentre consigo mesma.» Jorge Luis Borges, El Otro, El Libro de Arena.
No que me diz respeito, o princípio não se aplica, pois, por mais que me esforce, não consigo lembrar-me das onze mil virgens mártires, às mãos dos Hunos, nem vejo por que motivo alguém se lembrou de as enterrar na igreja do franciscano Santo António, em Alcácer do Sal.

E quanto a Átila (385-453), rei dos Hunos, também já esqueci a sua crueldade que, ainda antes de ter nascido, teria degolado Úrsula, na cidade de Colónia, no dia 21 de outubro de 383. O mais interessante é que nesta cidade, uma igreja guarda o túmulo de Santa Úrsula e das suas onze companheiras.

Sempre que recordo o passado, acabo por me desencontrar e, simultaneamente, perceber que a escrita é um lugar de perdição. Neste caso, são mil os passos perdidos… ou talvez, uma dúzia de virgens perdidas!

19.2.12

Embora não pareça…


Embora não pareça, o aprumo de nada lhe serve: os ramos murcharam e as pinhas secaram.

Em torno, o verde ainda desponta, mas a seca não perdoa.

Longe dos caminhos, continuam a desfilar as máscaras, indiferentes ao incêndio que alastra.

18.2.12

Ao entardecer…

O arame farpado bloqueou-me a voragem…

Entretanto, concluo a leitura da enciclopédia ficcional de Roberto Bolaño, A Literatura nazi nas américas,  e fico a pensar na excentricidade, na megalomania, na violência e na irracionalidade daqueles monstros que povoam o continente americano, e cujas raízes ora se escondem ora se revelam na europa…

E claro, o plágio é tão comum que, a páginas tantas (125), acabei por chocar com «o Pessoa bizarro das Caraíbas», cuja morte o encontrou «a trabalhar na obra póstuma dos seus heterónimos.» ( Max von Hauptmann)

(De facto, Roberto Bolaño convida-nos à voragem do entardecer!)

17.2.12

Os monstros…

Os sinais da doença que mina a sociedade portuguesa estão escancarados nas páginas dos jornais e nas televisões. Parece que, repentinamente, os monstros ganharam visibilidade sem qualquer justificação.

Ninguém arrisca uma explicação, ninguém assume a responsabilidade! No entanto, basta entrar numa sala de aula, do ensino elementar ao superior, para perceber que a cultura dominante é laxista: conversas laterais, posturas incorretas, palavras indelicadas, unhas a ser pintadas, lábios secos a necessitar de bâton de cieiro, telemóveis ligados, gorros que escondem headphones; trabalhos por fazer, desinteresse pelas matérias, permanente desatenção, manuais fechados ou esquecidos nos cacifos; falta de respeito por colegas, funcionários e professores. Frequentemente, na sala ao lado, o ruído é tão ensurdecedor … que as palavras que sobram revelam uma fonte anónima e dolorosa.

Claro que há quem defenda que tudo se resolve recorrendo à motivação, de preferência infantil ou, em alternativa, boçal. Talvez, o Carnaval ajude a libertar os demónios!

Com mais de um milhão de desempregados é criminoso manter  esta cultura escolar, sobretudo, porque ela  só gera mais desemprego, mais crime e mais monstros… E estes não necessitam de chegar a adultos para começar a destruir!

E também não necessitamos de governança porque esta procura o pacto: isto é, estar de bem com Deus e com o Diabo!

12.2.12

A rede social de Fernando Pessoa


Vá, vamos à Gulbenkian, ver como os brasileiros, de forma simples, elegante e digital, navegam na rede pessoana!

De facto, Fernando Pessoa não inventou a internet, mas criou muitos dos conteúdos que a podem alimentar – «Sem sintaxe não há emoção duradoura.»

11.2.12

Citação e paródia

Gustavo Borda (Guatemala, 1954-Los Angeles, 2016) respondeu um dia a quem lhe reprovava a inclinação germânica: «Fizeram-me tantas crueldades, cuspiram-me tanto, enganaram-me tantas vezes que a única maneira de continuar a viver e continuar a escrever era transferir-me em espírito para um sítio ideal…» Ora, na paródia do chileno Roberto Bolaño, esse lugar ideal é a Alemanha nazi.
Se cito, aqui, A Literatura nazi nas Américas, ed. Quetzal, é porque  o complexo de inferioridade portuguesa cresce à medida que o  número  de políticos e comentadores germanófilos aumenta. Os sinais da bota estão por todo o lado… e da democracia à ditadura vai um passo por enquanto enluvado…
A paródia recria os sinais, invertendo-os, mas não os faz desaparecer. Rimos, mas apetece chorar! A comédia alegra-nos, mas o que nos espera é a tragédia.
Roberto Bolaño (1953-2003) viveu exilado desde o início da ditadura de Pinochet, primeiro no México, depois nos Estados Unidos, para, finalmente, se instalar em Espanha. Internacionaliza-se com Os Detetives Selvagens, obra marcada pelo romance Paradiso do cubano Jose Lezama Lima. Em 1996, publica Literatura Nazi en America, novela escrita como se fosse um dicionário de autores admiradores e defensores do nazismo… As criaturas impressionam pelo seu realismo e respetiva loucura!
Para compreender este tipo de escrita (paródia) vale a pena ler: Vidas Imaginárias de Marcel Schwob; Spoon River Anthology de Edgar Lee Masters; Manual de Zoologia Fantástica de Borges ou A História Universal da Infâmia, também, de Borges.
As criaturas de Bolaño são mesmo infames porque vivem connosco e nós não as vemos e por isso vale a pena seguir o destino das personagens saídas do inferno do nosso destrambelhamento… da nossa inferioridade.

7.2.12

Se até um dente nos pode deixar gregos…

Para quê queixarmo-nos dos credores se até um dente (nosso!) nos pode dar cabo do juízo!

No meu caso, a solução foi simples: uma ablação dolorosa quanto baste. Efeito hemorrágico de sabor desagradável nas horas imediatas, porém compensado por gelado bem fresquinho que  o frio vai de feição!

Claro que, na minha idade, já não estou para namoros com odontologistas e quejandos e por isso sou pela extração rápida, se possível.

Chegado aqui, só me resta recomendar aos gregos, muito mais antigos do que eu, que procedam à ablação de qualquer credor que os atormente antes que se faça tarde… até porque as alternativas são muito caras e minam lentamente o humor e a saúde do paciente.

5.2.12

A rede

Diariamente, a rede  mostra a sua força, se colocada ao serviço do crime. Veja-se o que tem acontecido em Salvador da Bahia – 82 mortos, pelo menos. Tudo porque a polícia decidiu fazer greve!

O Brasil não é exceção, é proximidade. A Síria, por seu lado, mais distante, continua a chacinar os cidadãos que contestam a ditadura, mesmo se em nome de qualquer outra ditadura.

‘Distância’ e ‘proximidade’ exprimem, aqui afetos ou desafetos, e não lugares!

Ser homem pressupõe a rede neurológica. Ser humano exige a rede social; infelizmente, o crime, também, só é possível em rede!

Desde sempre, a rede esconde o seu modus operandi, gerando heróis do bem e do mal.

Para entendermos a rede, necessitamos de deitar abaixo os pedestais.

31.1.12

A transumância, em tempo frio e seco…

Quando um funcionário cria uma plataforma digital para registo (e gestão?) da avaliação do desempenho docente e lhe é, simultaneamente, conferida competência para interpretar o quadro legislativo regulamentar, corremos o risco de meter no mesmo saco quem coordena todo o processo de avaliação e avaliados.

Vem isto a propósito da impossibilidade de atribuição das menções qualitativas de excelente e de muito bom aos membros designados  pelo conselho pedagógico para constituírem as comissões coordenadores de avaliação de desempenho docente. Pensar-se-ia que essa escolha resultaria do mérito dos designados para a tarefa e que competiria ao referido órgão, concluído o processo, avaliar se, efetivamente, tinham desempenhado a função com isenção e rigor.

Mas não! Qualquer diretor, ao submeter a avaliação por si determinada, depois de ouvido o departamento de cada um dos docentes em causa, e não o conselho pedagógico, vê-se confrontado com a proibição de não poder ir além da menção de bom, caso o professor (membro da CCADD) não tenha requerido aulas observadas pelo mesmo diretor.

Em dois anos, o ministério da educação não foi capaz de compreender a incongruência de aplicar o mesmo critério a situações distintas. Hoje chega ao fim um processo de avaliação insustentável!

Pelo menos, para e por mim!

(De qualquer modo, esta minha crítica não faz muito sentido, pois há muito que conheço a qualidade do informático e, sobretudo, a sua capacidade de vender maçãs podres aos amigos, sejam eles de sindicato ou de partido.) 

28.1.12

Os símbolos

Antes era cerração, depois esplendor; agora é só bruma! De repente, os credores ficaram com pressa!

E nós, que fazemos? Matamos os símbolos, em nome da produtividade. Mas, de verdade, o que se passa é que os credores detestam  palavras como “independência”, “liberdade”, “república”, “democracia”…

E nós, fazemos-lhes a vontade!

/MCG

24.1.12

Falta de visão…

O euro da periferia vale cada vez menos porque o país faz apostas erradas há mais de 30 anos, designadamente na vertente educativa. Voltámos as costas ao Atlântico, abraçámos sofregamente o euro, sem qualquer interiorização da identidade europeia. Turistas apressados, eliminámos a fronteira, caindo de chofre nos braços dos credores.

A falta de cultura europeia impede-nos de dialogar, olhos nos olhos, com os dirigentes europeus, e, mais grave, impede-nos de desenhar um sistema educativo transnacional capaz de nos tornar parceiros e não pedintes…

As apostas de Crato são empobrecedoras porque visam recriar um nacionalismo bacoco imbuído de rigor positivista e, sobretudo, porque a escola pública programa a desigualdade entre os portugueses… A Crato falta visão europeísta e sem ela qualquer revisão curricular não passará de um ersatz…

22.1.12

O silêncio

Há dias tão longos, tão pesados que o melhor é matar-lhes a palavra!

Há palavras tão nuas, tão cruéis que o melhor é calá-las!

16.1.12

O escritor e o sátiro

Rui Zink foi à Escola Secundária de Camões, no âmbito da Semana das Profissões, falar sobre o prazer de escrever e sobre a precariedade do ofício da escrita. Explicou que escrever é um ato que exige cultura, talento, técnica, persistência e, sobretudo, vontade de desmontar os mecanismos de manipulação das consciências.  Soube escolher os exemplos, adequando-os e explicando-os a um público pouco familiarizado com a profissão de escritor, mas que soube entender o tom satírico, e terá registado a sugestão de leitura dos novos autores portugueses: Hugo Valter Mãe, José Luís Peixoto, Gonçalo M. Tavares, Dulce Maria Cardoso…

Da construção do discurso oral sobressaiu a capacidade de associar dados distantes e insólitos desencadeadores do sorriso dos interlocutores,  reforçando a ideia de que o riso é a melhor resposta à crise que nos é imposta.

No entanto, por detrás do tom jocoso e lúdico, foi possível notar o desencanto de quem sente que os portugueses continuam a reconhecer em Rui Zink não o escritor mas o sátiro.

PS: A iniciativa dos “camonianos” revela que estes jovens têm futuro!

14.1.12

A cinza!

É apenas uma rua sem princípio nem fim, dois ou três portais alçados; por eles sobem (ou descem?) três irmãs declinadas, e desde sempre enlutadas…

Perdidas as três irmãs, ficaram-me, indistintos, vários atalhos… e uma rua sem princípio nem fim!

11.1.12

Atonia

Faltam as cartas e as recomendações

os amigos escasseiam

e as abelhas esquecem a polinização

atónito

raciono as horas

10.1.12

Iníqua justiça

«Porem compre aos Reis seer justiçosos, por a todos seus sogeitos poder viir bem, e a nenhuum o contrairo.» Fernão Lopes, Crónica de D. Pedro I

Fernão Lopes, se hoje vivesse, estaria certamente boquiaberto face a um Estado que permite que os cidadãos da Madeira, ao dirigirem-se a uma farmácia, estejam a ser tratados de modo diferente dos do Continente.

Outrora, o Rei D. Pedro I procurava a todo o custo assegurar a equidade, independentemente dos afectos; hoje, o Presidente da República passa ao lado da iniquidade que grassa neste pretenso Estado democrático, perdendo definitivamente o direito a ser considerado um «homem bom».

« … porem a justiça he muito necessaria assi no poboo como no Rei, por que sem ella nenhuma cidade nem Reino pode estar em assessego.» ibidem

8.1.12

A vertigem do pó

O sonho da ascensão materializa-se, na maioria dos casos, em objetos utilitários e / ou simbólicos. Estes representam o poder e a vaidade humana - e exigem criatividade.

Hoje, ao atravessar a Praça D. Luís (Lisboa), repeti a sensação que, outrora, sentira no Largo Sá da Bandeira (Santarém): a arte, em regra, serve a megalomania do homem e o criador pouco mais é do que um servo.

Entretanto, entre estes dois tempos, experimentei e desafiei a profecia, sem nunca ter realizado a sonhada ascensão familiar, sem nunca ter compreendido a vaidade humana, pois, cedo, saboreei o pó de que somos feitos…

Desfeito o oráculo, a vertigem do pó entranhou-se definitivamente em mim, tornando-me estranho a tudo o que deriva do TER / do PODER.

5.1.12

Quebrada a linha, só a proa esfíngica se inscreve na memória. Quebrada a espera, só a elegia sossega …

A partir de agora, já não há regresso!

(Nova nau se vislumbra no cais da partida…)

2.1.12

Um dia à espera…

Um dia à espera… campos desertos e nas ruas, poucos transeuntes. Só nas superfícies comerciais, na zona da restauração, o movimento de gentes se faz notar. As lojas irremediavelmente fechadas…

Para além da espera, ruínas – prédios que implodem no interior da cidade ; o castelo imponente, encerrado.

Nas Urgências, o povo manso; o resto são regras de manchester (Quem as verifica?) No SO, 2 B, a humanidade presa por fios, ligada à máquina – sinal sebástico do milagre da ciência! A voz ininteligível, a certeza do nome, a VIDA!

Na espera, o chilrear dos pássaros e, neste longo intervalo, algumas ideias. Afinal, o Menino Jesus de Alberto Caeiro é uma adaptação do Cristo lusitano de Guerra Junqueiro. - Quem o diz? - Unamuno, sem ainda ter conhecimento da existência de Pessoa / Alberto Caeiro. Para além disso, a certeza de que não vale a pena construir sobre ruínas!